quarta-feira, 30 de setembro de 2009

Comentários Adicionais

Putz, tinha prometido não falar de Honduras, tinha prometido não me deixar levar pelas novelas que são instantaneamente criadas para logo serem esquecidas pela mídia, mas, enfim, alguns adendos.

Um seguimento mais delirante da curiosa interpretação que os herdeiros da UDN espalham é o seguinte: o Brasil estaria insuflando uma guerra civil, isso teria sido cuidadosamente planejado. O Brasil estaria no bolso dos planos bolivarianos de Hugo Chavez.

Sim, sim, claro. Os comunistas comem criancinhas e o ouro de Moscou financiava um Jango que planejava uma iminente revolução quando foi derrubado pelas forças democráticas.

Voltando: o Brasil e todo o resto do mundo condenaram o golpe. Se não me engano, foi por unanimidade na Assembléia-Geral da ONU, algo raríssimo. Creio também que nenhum país, nenhum, reconhece o "governo de facto". Aí o homem aparece na nossa Embaixada. (Ninguém tem o menor indício de prova de que teríamos sido avisados muito menos coniventes com isso. O resto é especulação, ou torcida.) Queriam que não deixássemos ele entrar para ser preso, humilhado ou até morto?

De resto, eu concordo inteiramente. A situação é complicada. A solução não está dada nem é simples. Zelaya se comporta de maneira não adequada. Em hipótese alguma ele deveria se manifestar politicamente. Mas também parece ser impossível controlá-lo. Vamos fazer o que, expulsá-lo?

Parece que o governo do Micheletti se recusa a negociar, barrou o Plano Arias, não quer conversar e declarou até o Estado de Sítio. O cara era aliado do Zelaya. Parece que há uma birra pessoal forte entre os dois. Digo "parece" porque não tenho acesso algum a qualquer inside information. Nem quero, tenho mais o que fazer. E se tivesse, não escreveria aqui, mesmo que tenha apenas 3 leitores.

Então é isso, a situação é complicada. A comunidade internacional está inteiramente unida, havendo as óbvias divergências de tom sobre a questão. Nenhum encaminhamento agora será simples. Vamos ver. Bom senso ajuda. Olhar para o futuro também.

Enquanto isso, no G-20, novo órgão decisório mundial, ao qual o FMI e o Banco Mundial estão subordinados, começam tratativas para a institucionalização do grupo. A imprensa alemã, francesa, australiana, inglesa, norte-americana e outras apontam uma grande vitória dos BRICs, que atuaram com estreita coordenação.

Lula vai receber mais alguns prêmios internacionais nas próximas semanas. Ouve-se por aí que pode ganhar o Nobel da Paz.

Mas, enfim, a política externa é um fracasso e envergonha o país. Certas estão algumas famílias que monopolizam o noticiário nacional. Eles não se conformam com o que vem acontecendo. Devem ter se matado de raiva quando o Serra indicou concordar com o modelo do pré-sal.

Isso me faz rir. Há grupos que estão órfãos, coitados, que pena. Perderam o poder de fazer a cabeça das pessoas. Estão desacreditados, desmoralizados.

O Brasil vai amadurecendo para um difícil século XXI. O pós-Lula será nosso grande desafio, para além de um setor financeiro à parte da economia produtiva, dos efeitos da ação do homem sobre o meio-ambiente e do constante perigo de eclosão de alguma guerra desestabilizadora. Ameaças que, evidentemente, dependem para sua superação de uma estreita e eficaz coordenação internacional.

Mas, voltando a nosso querido Brasil, Ciro Gomes vem alertando, corretamente, que só a figura mítica do Presidente Lula consegue conciliar interesses tão diversos, trabalhar com forças tão complicadas quanto o PMDB, sindicatos, bancos, empresários, a esquerda, o agribusiness, os movimentos sociais, a feroz mídia nativa, etc... e tal. Qual será o modelo político em 2011, como os interesses serão balanceados, que forças irão sustentar uma nova coalizão? São algumas das questões fundamentais. É pena que não estarei aqui para presenciar in loco a transição.

Ars longa,
vita brevis,
occasio praeceps,
experimentum periculosum,
iudicium difficile.

terça-feira, 29 de setembro de 2009

Sobre Honduras

Não. Não vou escrever sobre Honduras. Só se fala em Honduras. Na TV e nos jornais. A versão mais inteligente, se é que me entendem, divulgada por alguns sábios muito bem informados, é a de que o Chavez estaria manipulando o Brasil. Que armamos a volta do Zelaya. Que a política externa envergonha o país e é contrária aos nossos princípios históricos de atuação.

Olha, não nego que a entrada do Zelaya, um cara meio fanfarrão, com dezenas de seguidores, na Embaixada brasileira, tenha sido um negócio chato. Chato demais. A situação hoje não é simples nem confortável. Mas ele é o Presidente eleito e foi deposto, expulso do país. A OEA, a União Européia, a União Africana, todos se manifestaram por unanimidade. A ONU. Dizer que o Brasil está isolado e viajou é um baita exagero. É preciso ser muito cínico. Isso não quer dizer que a situação atual seja simples nem confortável. Mas daí a estrebuchar, é sinal de que está faltando assunto.

Assunto que na verdade não faltava. Meu Deus, durante décadas o Brasil demandou acesso ao núcleo do poder mundial. Saímos da Liga das Nações por não aceitarmos um papel menor. Estamos firmes na articulação por uma necessária reforma no Conselho de Segurança. E nessa última semana, quando só se falou de Honduras, caramba, o Brasil conseguiu um resultado ótimo no G-20. O país, na linha de frente das negociações, viu ser confirmada a proeminência do grupo, o agendamento de duas outras Cúpulas para 2010 e mais diversos avanços regulatórios, em matéria de coordenação e de reformas institucionais que poderão se materializar com o tempo.

Como em Londres, colocaram o Pres. Lula ao lado do anfitrião na foto oficial de Pittsburgh. A imagem vale tudo. A diplomacia é feita de detalhes. O Presidente é o cara. A Newsweek o comparou ao Mandela. O Times, o Independent, a Economist, o International Herald Tribune, todos tecem loas ao novo papel do Brasil. E por aqui só se lê que a diplomacia é um fracasso. Será que os leitores de algumas publicações não enxergam o óbvio?

Poucas análises têm captado o que vem se passando. O poder mundial escorrendo e sendo agarrado, reconstruído, pelos grandes países em desenvolvimento. Mas os caras só falam de Honduras e tentam criar uma novelinha de uma história reconhecidamente complexa, mas com uma certeza que só os fanáticos políticos possuem, proclamam que a diplomacia brasileira é um fracasso, nos envergonha e tal. Que culpa temos se o fanfarrão deposto, mas democraticamente eleito, apareceu na porta da Embaixada. Deixaríamos ele ser morto nas ruas? Preso e humilhado? O cara foi eleito e sofreu um golpe! As eleições ocorreriam ao final de novembro e ele não era candidato, não postulava nada.

É aquela coisa que comentei no post sobre o Jessé: transformam coisas complicadas em caixinhas bem x mal. Supremo cinismo, proclamam que a diplomacia é um fracasso contrariando a mais óbvia realidade.

Enfim, tento não esculachar demais, segurar a indignação. Mas às vezes é difícil. No fim-de-semana estarei em São Paulo Babilônia Selva. Por lá ouvirei mil pessoas bem intecionadas, mas pessimamente informadas, me questionando sobre Honduras, sobre a vergonha que o país passa, etc... Quando na verdade nunca o país esteve tão firme. Com tantos apoios. Responsabilidades, expectativas. Armadilhas. Desafios. Ninguém disse que a coisa é fácil.

O jogo político é muito duro, a verdade é a primeira a perecer. Por aqui, a quinta coluna é forte. Estão sempre prontos a tomarem partido de certos interesses incofessáveis. Herdeiros da UDN. Minoria golpista, rentista, excludente. Não contam com candidato para 2010. Não vejo o Serra nem o Aécio jogando o jogo deles. Assim espero. O Brasil avança.

Armadilhas previsíveis e repetitivas

A cobertura da grande imprensa em temas econômicos e de política externa é muito fraca. Enviesada, politizada, cínica em alguns momentos. Conforme as eleições forem se aproximando, isso só vai piorar. O processo eleitoral é também uma janela para alguns oportunistas. Vamos lá:

1: A posição fiscal brasileira é excepcional. Conforme já demonstrei em posts anteriores, quando comparamos o Brasil aos outros países do G-20, estamos muito tranquilos. Se compararmos os números com outros momentos de nossa história, também não há o que contestar.

Porém, só leio e escuto que há uma gastança generalizada, que há farra fiscal, aumento de gastos permanentes que nada têm de anti-cíclicos. Chavões, meias-verdades, exageros óbvios. Basta ver os números. É simples.

Se acrescentarmos ao excelente quadro atual o crescimento da economia mais firme em 2010, 2011, 2012..., num cenário de taxas de juros muito mais adequadas, embora ainda altas, temos que a relação dívida/PIB não apresenta o menor problema.

Porém, não é isso que diversos "analistas" e "jornalistas" por aí têm colocado.

2) Na medida em que, segundo o discurso, há uma farra fiscal e considerando o crescimento econômico esperado de 4-5%, a segunda perna do oportunismo dá como certo um aumento da inflação para 2010. Ignora assim incertezas externas, uma inflação que no Brasil é, segundo diversos estudiosos, muito mais de custos do que de demanda, o câmbio valorizado e a concorrência dos importados. O raciocínio muito esperto é de uma certeza que me espanta.

3) Daí vem a terceira e última perna da jogada. Na medida em que há farra fiscal e que isso trará inflação, dá-se como certo um aumento dos juros. O mercado já precifica uma taxa futura maior. Cria-se um cenário. O BC entra no jogo e adverte para os riscos do tal descontrole fiscal, insinuando subidas nos juros. Forma-se um consenso, solidificam-se expectativas. E assim a profecia se tornará realidade. E o mais engraçado é que os juros maiores, aí sim, vão bater direto nas contas públicas. 1% a mais nos juros deve significar uns R$ 12 bilhões em gastos. Essa é uma verdadeira farra fiscal, mas curiosamente seus arautos posam de responsáveis defensores da estabilidade. Cortem os gastos públicos: demitam policiais federais, fiscais do Ibama, da Receita, reduzam os vencimentos dos diplomatas, dos aposentados, cuidado com os aumentos no salário mínimo.

É interessante também que nessa jogada tão manjada e óbvia não apareça ninguém para questionar a premissa fundamental que assinalei no item 2: a inflação no Brasil é mesmo de demanda? E prossigo: a taxa de juros de curto prazo é o melhor instrumento para controlá-la, tenhamos ou não essa inflação de demanda?

Por fim, por que o Brasil necessita de taxas de juros reais tão acima de cento e noventa tantos países no mundo? O que explica nossa jabuticaba?

Há ainda uma cereja no bolo dessa brincadeira toda: é o chamado "risco político" para 2010. Algo que perdeu muita força com o passar dos anos e o gradual enfraquecimento da ideologia e do poder de fato dos analistas de mercado, do investidor estrangeiro, dos credores da dívida, enfim.

A democracia, por natureza, é o reino do contraditório. Da divergência, das alternativas, das opções. Mas a "racionalidade do mercado", seus dogmas, seu jogo de cartas marcadas, a manada, enfim, fica preocupada nesses momentos. Pedem mais, eles querem mais. É apenas um exemplo do que chamo de "totalitarismo liberal de mercado", hoje felizmente muito enfraquecido, mas ainda operando. No reino da racionalidade econômica, as eleições muitas vezes não são bem vistas.

O rentismo se vê ameaçado pela queda nos juros reais. Pelo avanço dos bancos públicos na ofera de crédito em melhores condições. Há ainda a velha ladainha contra os gastos sociais. São muitas coisas.

Ninguém aqui é contra o mercado ou o equilíbrio nas contas do governo. Mas é preciso bom senso, números, argumentos, e não um ensaio de jogadinha manjada como já vimos no passado. E deve-se respeitar o processo democrático.

Nem Serra, nem Ciro, nem Dilma, nem Aécio, nem Marina nem ninguém ameaça a excepcional posição em que o Brasil se encontra. Nem o Zelaya muito menos o Chaves.

É hora de amadurecer o debate. Fico feliz, portanto, ao ver alguns analistas de mercado, economistas de grandes bancos, comentaristas políticos, saindo do lugar comum, olhando as dificuldades de outros países e comparando-as com nosso potencial, e afirmando corajosamente: não há o que temer, o Brasil deve avançar, não há riscos, o quadro é sólido.

São exceções, é verdade, mas cada vez menos raras. Quando Estado e Mercado operam afinados para o desenvolvimento da Nação, num país absolutamente pleno em recursos como o Brasil, não temos o que temer. Muito menos um tal "risco político", como se a divergência democrática e a avaliação de alternativas, eventuais mudanças de rotas, fossem contrárias ao interesse da sociedade.

sábado, 26 de setembro de 2009

O sentido do blog

Para dentro, para fora, agora, ontem, muito embora, escrever é um exercício solitário, é para poucos, é para mim, há possíveis exageros e às vezes cresce a tentação de reescrever, reelaborar, repensar, contradizer, aliviar, nuances, pontos de vista, perspectivas.

Estado e Mercado não são opostos. Interagem. É preciso equilíbrio. Se a balança está para um lado, então vamos para o outro.

O sentido do blog na voz de Claudia. Que grata surpresa.

Nos próximos dias, a democratização dos meios de comunicação em "Na real do Real", o olhar apurado da "Cidade dos Muros" de nossa brilhante Teresa Pires do Rio Caldeira e ainda Mariana Fix mirando no cerne da questão em sua "Ponte para a Especulação".

Antes de lhes deixar com o desabafo de Claudia, fica o link para o último estudo do IPEA sobre a concentração de renda no Brasil. As coisas estão melhorando, mas há uma longa estrada. A estrada da vida. La Strada.

sexta-feira, 25 de setembro de 2009

Tempo, tempo, tempo

Assembléia-Geral da ONU, G-20 em Pittsburgh, Honduras, economia brasileira, câmbio, Copa 2014, pré-sal, eleições... muitos assuntos para pouco tempo do blogeiro. Queria também complementar o post sobre o grau de investimento com menos esculhambação e uma análise um pouco melhor de quais os impactos positivos e também os negativos (câââmbio) de mais dinheiro entrando no Brasil.

Mas está difícil de parar e escrever algo. Minha cabeça parece estar longe, bem longe, em aprazíveis lugares distantes como a China.

quarta-feira, 23 de setembro de 2009

Duplipensar

Duplipensar, Orwell, 1984, muitos leram, é um clássico. Guerra é Paz, Liberdade é Escravidão, Ignorância é Força.

Os bancos, seus analistas, seus papagaios na imprensa e na academia, todos passaram os últimos 20 anos falando nos benefícios do mercado, da concorrência, de um capitalismo competitivo, o império do consumidor e por aí afora. E lá se foi nosso Brasilsão.

Pois bem, a FSP de hoje publica matéria sobre a concentração no mercado financeiro. Os cinco maiores bancos concentram cerca de 77% dos ativos. A matéria compara os dados atuais com o período imediatamente anterior à crise. Seria interessante que fosse feito um levantamento com os dados, por exemplo, de meados da década de 90.

A concentração não é necessariamente ruim. Mais importante é a expansão do crédito a custos razoáveis, tarifas em conta e serviços de qualidade, suporte às micro e médias empresas em especial em setores "verdes" e/ou inovadores e/ou com grande impacto social. Mais importante ainda é evitar que nossos "too big too fail" cometam imprudências semelhantes às perpetradas por seus pares no mundo desenvolvido.

Porém, fica essa constatação irônica. O mercado desregulado, livre, leve e solto, não levou, no setor financeiro e em diversos outros, no Brasil e no mundo, à ampliação da concorrência. Ao contrário, promoveu concentração.

Pode-se apontar, evidentemente, que a "globalização" exige maiores economias de escala, que isso é importante para ampliar a internacionalização dos grupos brasileiros e outros argumentos de lógica mais pragmática. Porém, entre o discurso e a realidade, entre a teoria do livro texto e a constatação hmmm empírica, vemos aí uma grande distância.

Guerra é Paz. Liberdade é Escravidão. Ignorância é Força.

Grau de Investimento

A Moody´s promoveu o Brasil a grau de investimento. Notícia boa, é óbvio. Não atrapalha, é evidente. Mas dá pra levar a Moody´s a sério? Por acaso há algo de científico, ou racional, ou lógico, nos obscuros critérios das agências de risco?

Sim, há um pouco de critério. Mas são bem maleáveis. Por exemplo, nosso déficit, nossa dívida pública e a dívida externa estão absolutamente sob controle. Não há o menor risco de qualquer problema. Então porque essa demora toda em promover o Brasil?

Uma rápida olhada numa hipotética tabela dos países com suas classificações de risco ao lado dos indicadores de déficit e dívida já demonstraria toda a falácia dos critérios das agências. O Brasil tem indicadores melhores do que boa parte dos países do G7, senão de todos. Nossa posição é muito mais sólida do que a de diversos países que têm o glorioso grau de investimento. Talvez uns 5 países apenas atualmente estejam em melhor situação. E qual a classificação do Reino Unido? Da Espanha? Da Grécia? Da Irlanda? Do México? Da África do Sul? Turquia? Colômbia? Comparem as classificações desses países com a do Brasil. Depois vejam os números. Acrescentem a isso as perspectivas do pré-sal, do crescimento do crédito e do mercado interno. Enfim...

Na verdade, o próprio mercado financeiro internacional opera cheio de preconceitos. Dêem uma olha na tabela da última página do Economist, que assinala os spreads dos títulos de 10 anos. O Brasil vem diminuindo o custo de captação, mas ainda há um delta injustificável. Países que atualmente estão numa situação muito chata ainda se financiam mais barato do que nós.

Mas voltando aos analistas das agências de risco, coitados, vivem dessas classificações politicamente enviesadas e às vezes arriscam recomendações por "reformas estruturais". Antes eram clamores por reformas diariamente. Parece que hoje avançamos, a coisa tá mais comedida, mais discreta. Afinal, os caras estão mais humildes, após a enormidade de asneiras que fizeram. E hoje há um entendimento geral de que não há receita de bolo para o desenvolvimento. Mas a postura de alguns desses analistas de risco continua sendo de uma cretinice total.

Bom, avanço na crítica ressaltando que as agências são remuneradas pelos emissores de títulos, não pelos investidores, por exemplo. Há um claro conflito de interesses. Não sei bem a quantas andam as propostas de regulação dessas criaturas. Vou verificar. Recordo ainda que as agências de risco formam um oligopólio, representam mais uma falha nos mercados.

Os caras erraram grotescamente diante da crise. Foram cúmplices, partícipes, atores em todo o castelo de cartas que desabou. Jogaram juntos na chantagem ao Brasil que ocorreu entre 1995 e 2004. "Façam o dever de casa ou a confiança do investidor estrangeiro desaparecerá e o país vai quebrar."

Retomo pela milésima oitava vez esse estandarte: um país como o Brasil não pode se colocar sujeito às avaliações desse tipo de gente. Dependente desse tipo de percepção. Submisso aos fluxos de capital externo, mesmo que sejam IED, para financiar seu crescimento. Por digo, repito, recomendo e reitero: não podemos brincar com a conta corrente nem com a dívida interna. Uma nação como a brasileira não pode se submeter passivamente às vontades dos credores da dívida. Pior ainda se assimilar mentalmente as demandas de nossos credores como sendo o nosso interesse. Esse é um passado trágico, e recente, que esperamos não mais retorne.

Parágrafo de uma frase só: a identidade contábil que coloca que o déficit em conta corrente representa poupança externa que complementaria nossa baixa taxa de investimentos, decorrente da baixa poupança interna, é uma falácia perigosíssima.

Enfim, volto. Acho divertidíssimos os argumentos desses pobres analistas das agências de risco. Realmente é engraçado ver a pose de seriedade, de juízes da sustentabilidade econômica, da lógica supostamente racional que os rege. E aí me recordo que os números mais básicos desmentem as classificações deles. Recordo-me que eles erraram para tudo quanto é lado. Desde a crise do México, até o leste asiático, até a Russia, a Argentina, a bolha da internet, os caras já têm um histórico de chorar. É curioso como continuam com certo ibope.

Esse post ficou meio bagunçado, talvez esculhambado. Mas o recado tá mais ou menos claro, penso. Promoveram o Brasil? Que bom. Precisamos desses caras? Não. Eles sabem do que falam? Não. Eles têm algum compromisso com o desenvolvimento da nação? Não. A quem eles respondem? Aos credores da dívida brasileira e, de maneira geral, aos centros das finanças globais. Eles têm algum poder? Infelizmente, ainda têm. Portanto, ruim com eles, pior sem eles. Mas não vale muito ibope não. Aliás o ibope não vale nada.

Esse post faz questão de singularizar a empresa de Rating do Paulo Rabello de Castro, um cara que venho aprendendo a admirar pela inteligência e coragem de se contrapor ao lugar-comum que prevalece entre os analistas de mercado. Aliás, estou devendo um post sobre esse tipo de criatura. Em geral, são medíocres. O comportamento de manada e, mais importante, as idéias de manada prevalecem. Mas há alguns muito bons. Para debater com eles, é preciso estofo. Voltarei ao tema.

segunda-feira, 21 de setembro de 2009

pelamordedeus

essa mulher tá demais

Mais

No Caderno Mais da Folha de hoje, há um artigo de um diretor da Escola de Economia da FGV-SP fazendo uma espécie de defesa (achei meio fraca, por sinal) de sua área de especialização, que tem sido violentamente criticada após a crise. Ele menciona que na semana passada o mesmo Caderno publicou artigos diversos sobre o tema. Vou buscar, já que estava longe e não li nada.

Porém gostaria de destacar e subscrever a notinha abaixo, no mesmo Caderno Mais, de nossa amiga Sandra Corveloni. Cabíria, aliás, é o nome de um cine-cubículo, talvez a menor sala de cinema do país, que fica aqui logo ao lado de casa. De graça. Maravilha.

Um dia faço um post sobre o filme.


Biblioteca Básica

As Noites de Cabíria
SANDRA CORVELONI
ESPECIAL PARA A FOLHA

Eu me lembro exatamente do dia em que vi "As Noites de Cabíria" [de Federico Fellini, 1957] e da sensação que tomou conta do meu corpo e da minha mente durante e após o filme.
Tanta poesia, humanidade, dor e, apesar de tudo, amor pela vida, música. A direção de Fellini é genial e Giulietta Masina [que interpreta Cabíria] é simplesmente magnífica. Não me esqueço do olhar dela; é uma mulher e é, ao mesmo tempo, a cidade [Roma].
Esse filme é como um banho espiritual de beleza, de metáfora, de imagens.

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SANDRA CORVELONI , vencedora da Palma de Ouro de melhor atriz no Festival de Cannes em 2008 (pelo filme "Linha de Passe"), está no elenco da peça "O Livro dos Monstros Guardados", em cartaz no teatro Imprensa, em São Paulo.

domingo, 20 de setembro de 2009

Na Mosca

No Baseline Scenario, críticas agudas ao discurso de segunda-feira em NY e, de maneira geral, às propostas do Governo Obama com relação ao sistema financeiro.

Comentários ácidos sobre o não comparecimento dos CEOs de todos os grandes bancos norte-americanos.

E a descrição de uma jogada muito esperta do Barclays no Reino Unido. Estão transferindo ativos podres para um agente ligado ao banco, mas que não é banco. Portanto, está fora do alcance da regulação. Há ainda detalhes contábeis muito interessantes.

O Baseline é um must read.

There´s a natural mystic blowing

Dont ask me why.. things are not the way they used to be

sábado, 19 de setembro de 2009

Adendo ONU

Lendo com calma o discurso todo do Pres. da Assembléia-Geral, sou obrigado a dizer que não é tão bom assim. Bem intencionado, mas preso a uma série de amarras. A burocracia da ONU, certa retórica, temas e uma linguagem recorrente.

Melhor ler com calma antes de postar.

sexta-feira, 18 de setembro de 2009

Entrevista do Presidente Lula

A entrevista do Presidente Lula, publicada hoje no Valor, me deixou muito feliz. É um grande homem, com uma grande história, que deixará um grande legado. Um democrata, um conciliador, um homem com visão de Estado e de país. Verdadeiro líder, inteligente ao extremo, carismático.

É possível lhe fazer várias críticas mais pessoais, eu sei, eu mesmo tenho algumas. Seu governo teve, e tem, como não poderia deixar de ser, erros maiores e menores. Mas é difícil questionar o fato de que deixará um Brasil muito melhor do que aquele que encontrou. Em todos os aspectos. Muito longe ainda do ideal, muito longe, distante, a léguas de nosso potencial. Mas melhor, mais democrático, mais humano, com menos pobreza, mais oportunidades, um país otimista, sonhador, lutador.

Há muito o que fazer. Muito. Mas o Presidente Lula, construindo sobre algumas bases de FHC, que por seu turno herdou um quadro macroeconômico de primeiríssima de Itamar, fez com que avançássemos.

Outro dia elaboro melhor sobre o tema, vamos aguardar o fim do mandato. Aqui, o link para a entrevista completa, sem a edição do Valor.

PS: O sitio www.info.planalto.gov.br proporciona as íntegras de todas as entrevistas e discursos do Presidente. Mais para frente comentarei sobre o livro, que pretendo folhear, quem sabe até ler, do funcionário da família Marinho que apresenta sua leitura particular das palavras do Presidente Lula.

PS2: Adendo posterior ao post original: sugiro a leitura do discurso na cerimônia de aniversário de 45 anos do IPEA. Transborda otimismo.

Documentos do sistema ONU

A ONU não funciona bem, sabemos disso. Na hora de passar das palavras para a ação, a coisa complica. Há um evidente problema de representatividade e legimitidade do Conselho de Segurança. Que na maior parte das vezes também é ineficiente dado o direito de veto. Mas sem ela, estaríamos muito piores. Portanto, tudo contra a ONU, mas viva a ONU!

Você encontra aqui o relatório anual da UNCTAD, sempre uma respeitável peça analítica.

Aqui temos o último discurso do Padre Miguel D´Escoto como Presidente da Assembléia-Geral da ONU. Eu já disse aqui que simpatizo com ele. É um homem de bem. Suas palavras merecem ser lidas.

Por fim, segue o relatório da Comissão da ONU que investigou os conflitos na Palestina ao final do ano, logo antes das eleições em Israel.

Ausência e Retorno

Estive fora por alguns dias, sem condições de blogar. Voltando lentamente, ainda com fuso horário estragado. Muita coisa interessante aconteceu nesses últimos dias.

Nosso amigo Obama voltou das férias e fez alguns discursos para fortalecer suas propostas no Congresso. São 3 as principais: sobre o sistema de saúde, sobre mudança do clima e sobre regulação no sistema financeiro. As 3 estão com problemas para aprovação e sofrem uma campanha de desinformação tremenda. Obama falou sobre a primeira e fez um discurso, em NY, para a nata de Wall Street, no dia em que completamos 1 ano da quebra do Lehman.

Aliás, o Financial Times publicou recentemente artigos do Niall Ferguson e do Martin Wolf muito bons. O texto do Niall, um jovem conservador, muito inteligente, autor de obras de fôlego sobre as finanças e a política mundial, questiona o fato de que deixar o Lehman quebrar teria sido um erro. Para ele, a bancarrota do gigante de Wall Street, ao assombrar os EUA e o mundo, forneceu suporte político para que os governos fizessem intervenções maciças para salvar o resto do sistema financeiro. Otherwise, os congressistas e a opinião pública e publicada não aceitariam pacotes de resgate e medidas tão ousadas. O artigo está aqui.

Já Martin Wolf prossegue no esforço generalizado das pessoas de bom senso em colocar um pouco de cautela nos otimistas de sempre, nos que querem sair na frente em novos booms especulativos, naqueles que desejam retornar ao "business as usual" como se nada tivesse acontecido. Leia aqui. Wolf não é um radical anti-americano nem anti-mercado, sabemos disso, basta reparar no seu posto e, por exemplo, em como ele subscreveu a discutível tese do "global savings glut" como uma das principais causas da crise.

Bom, é isso por enquanto. Volto em breve.

sábado, 12 de setembro de 2009

quarta-feira, 9 de setembro de 2009

O Estado de todas as culpas

Aos meus três leitores, comento que tenho escrito aqui, de uma maneira ou de outra, geralmente falando sobre crise, copom, câmbio, mídia, Sarney, Copa e etcétera, que há falhas muito graves na maneira como determinados debates têm sido conduzidos no país. São simplificações, visões rasteiras, PSDB x PT, ética x corrupção, racionalidade do mercado x politicagem no setor público, pusilânime com Bolívia x agressivo contra EUA, enfim, distorções presentes nos mais diversos temas que procuram encaixar coisas complexas em caixinhas bem x mal. Tem bastante gente por aí cheia de certezas. Eu prefiro ficar com minhas perguntas.

No excelente caderno Aliás do Estadão, no domingo último, temos um artigo de um sociólogo, professor em Juiz de Fora, Jessé de Souza, sob o título "O Estado de todas as culpas".

Vou me limitar, agora, a transcrever o artigo. Estava jogando bola e estou sem condições de comentá-lo. Mas recomendo vivamente a leitura. Lógico que teria observações a alguns trechos, é tudo muito polêmico, mas o raciocínio tem a ver com muita coisa que escrevo, sistematizou alguns pontos que talvez eu já tenha assinalado, enfim, foi mesmo uma grata surpresa ler esse texto e vou procurar mais trabalhos de nosso amigo Jessé...


O Estado de todas as culpas
Ele é só associado à ‘politicagem’. E o mercado, à ‘racionalidade’: eis a trava do debate público no Brasil

Jessé Souza*

O debate público e político brasileiro, há algumas décadas, é travado sob a forma de um suposto conflito entre mercado e Estado. A atual discussão sobre o petróleo do assim chamado pré-sal apenas o confirma. Assim sendo, se quisermos compreender efetivamente o que está em jogo nesse debate conjuntural sobre o que fazer com o dinheiro do petróleo recém-descoberto - assim como compreender os debates conjunturais do passado recente e dos que ainda vão acontecer no futuro próximo - temos que focar nossa capacidade compreensiva na reconstrução da estrutura invisível presente em todas essas situações conjunturais passageiras. O tema do debate muda ao sabor das circunstâncias. Sua "estrutura profunda", no entanto, permanece a mesma. Qual é a estrutura profunda nunca tematizada enquanto tal na mídia? O Estado é sempre suspeito de "politicagem" e de "aparelhamento" por indicações políticas e o mercado é definido como instância "técnica", ou seja, reflexo da "racionalidade pura" e do "cálculo técnico". Um é a esfera do "privilégio inconfessável" e o outro o reflexo da "razão técnica" supostamente no interesse de todos. É isso que explica o foco constante e diário na "corrupção política" como a lembrar ao público onde está o mal e onde está o bem. Como tudo no mundo social, essa é uma realidade "construída", fruto de uma leitura seletiva e interessada do mundo.

Como a recente crise mundial mostrou sobejamente (já nos esquecemos dela?), a corrupção é endêmica tanto no mercado quanto no Estado em qualquer latitude do globo. A mitigação da corrupção em qualquer esfera da vida ocorre quando os mecanismos de controle ganham eficiência. A leitura seletiva do Estado como ineficiente e corrupto e do mercado como pura virtude esconde a ambiguidade constitutiva dessas duas instituições que podem servir ao bem ou ao mal conforme seu uso. Por que a "dramatização" cotidiana mil vezes repetida de justamente essa visão distorcida do mundo? A meu ver porque ela é o núcleo mesmo da violência simbólica - aquele tipo de violência que não "aparece" como violência - que torna possível a manutenção e a reprodução continuada no tempo da sociedade complexa mais desigual e injusta do planeta.

O mundo social não é perceptível a olho nu. Pode-se ver a pobreza e a desigualdade nas ruas e não se perceber suas causas. O brasileiro das ruas aprendeu a vincular as mazelas sociais do Brasil à corrupção política. A tese do Estado corrupto - ou a tese do "patrimonialismo" na sua versão erudita igualmente conservadora e frágil - mata dois coelhos com uma mesma cajadada. Como o conflito que ela cria é falso de fio a pavio - na realidade, mercado e Estado são interdependentes e igualmente ambivalentes -, ela ajuda a fabricar uma realidade que permite esconder todos os conflitos sociais reais. Pior ainda. Como uma falsa oposição é dramatizada como "conflito", tem-se a impressão de que existe efetivo debate crítico entre nós, de que temos uma esfera pública atuante, uma mídia atenta e crítica e um país politicamente avançado, quando a realidade é, ponto por ponto, precisamente o inverso.

A dramatização do Estado ineficiente e corrupto serve como fachada para "representar" a política sob a forma simplista, subjetivada e maniqueísta das novelas, enquanto se cala e se esconde acerca das bases de poder real na sociedade. Toda a aparência é de "crítica social", enquanto toda ação efetiva é a da conservação dos privilégios reais. Assim, fala-se do combate aos "coronéis" e às "oligarquias" - sempre caricatamente nordestinas como o bigode de Sarney - enquanto escondem-se as reais novas oligarquias responsáveis por abocanhar quase 70% do PIB sob a forma de lucro ou juros reduzindo os salários a pouco mais de 30%. Nos países europeus social-democratas essa proporção é inversa. As falsas oposições escondem oposições reais. O falso "charminho crítico" da dramatização do Estado ineficiente e corrupto serve para esconder e desviar a atenção para a luta de classes que cinde o país entre privilegiados que possuem um exército de pessoas para servi-los a baixo preço e dezenas de milhões de excluídos sem nenhuma chance nem esperança de mudança de vida.

Para todo um exército de analistas que se concentram no "teatro" da política - com suas fofocas e escaramuças diárias entre senadores e deputados com poder decisório entre o nada e o muito pouco - falar-se em "luta de classes" é um tabu. Luta de classes é coisa do passado, tem a ver com greves de trabalhadores e sindicatos que estão desaparecendo ou perdendo importância. Essa é a cegueira da política como "espetáculo" pseudocrítico para um público acostumado à informação sem reflexão. A luta de classes só é percebida nas raras vezes em que as classes oprimidas logram alguma forma de reação pública eficaz. Condenam-se ao esquecimento todas as formas naturalizadas e cotidianas do uso e abuso do trabalho barato e não valorizado. Um pequeno exemplo. O exército de babás, empregadas, faxineiras, porteiros, office-boys, motoboys, que permitem que a classe média brasileira possa dedicar seu tempo a trabalhos valorizados e bem pagos relegando o trabalho pesado e mal pago a outra classe de seres humanos que tiveram o azar de nascer na família (e na classe social) errada. Isso não é "luta de classes"? Apenas porque não há piquetes, polícia e sangue nas ruas? Apenas porque essa dominação é silenciosa e aceita, dentre outras coisas porque também eles, os humilhados e ofendidos, ouvem todo dia que o nosso único mal é a corrupção no Senado ou em algum órgão estatal?

E para as classes média e alta? Não é um verdadeiro presente dos deuses ter privilégios que nem seus consortes europeus ou norte-americanos possuem e ainda poder ter a consciência tranquila de quem sabe que o mal do Brasil está em "outro" lugar, lá bem longe em Brasília, um "outro" abstrato, mau por definição, em relação ao qual podemos nos sentir a "virtude" por excelência? Não se fecha com isso um círculo de ferro onde necessidades sociais e existenciais podem ser manipuladas por uma política e uma mídia conservadora e seu público ávido por autolegitimação e por consciência tranquila?

Para Max Weber - pensador crítico mal lido entre nós como inspiração para a tese do patrimonialismo - os ricos, saudáveis e charmosos, em todas as épocas e em todos os lugares, não querem apenas ser ricos, saudáveis e charmosos. Eles querem saber que têm "direito" a serem ricos, saudáveis e charmosos em oposição aos pobres, doentes e feios. É essa necessidade o verdadeiro fundamento e razão do sucesso da tese da suspeição do Estado entre nós. Ela serve como uma luva para não perceber e naturalizar um cotidiano injusto e ainda transferir qualquer responsabilidade para uma entidade abstrata e longínqua, garantindo boa consciência e aparência de envolvimento crítico na política.

A cortina de fumaça do falso debate acerca da demonização do Estado serve para deslocar a única e verdadeira questão do Brasil moderno: uma desigualdade abissal que separa gente com todos os privilégios, de um lado, de subgente sem nenhuma chance real de uma vida digna desse nome, de outro lado. O culpado desse crime coletivo não é apenas o bigode de Sarney. É toda uma sociedade infantilizada por falsos debates e por falsas prioridades e que ainda se pensa - suprema autoindulgência - como crítica e atuante. Esse projeto político não é de partidos, até porque o consenso conservador atinge todos indistintamente. As tímidas iniciativas de política social do atual governo, por exemplo, são mero paliativo da efetiva redenção dos secularmente humilhados e ofendidos. O que fazer com os recursos do pré-sal poderia e deveria ser o estopim para um novo debate brasileiro, corajoso, maduro e generoso, por oposição ao debate covarde, infantil e mesquinho que temos hoje.

*Doutor em sociologia pela Universidade de Heidelberg (Alemanha) e professor titular da Universidade Federal de Juiz de Fora, é autor de A Ralé Brasileira: Quem É e Como Vive, a ser publicado em outubro pela UFMG

segunda-feira, 7 de setembro de 2009

Grande Depressão x Crise atual

Atualização do célebre post de Eichengreen e Rourke comparando a crise atual com a Grande Depressão dos anos 30. É cedo para comemorar.

Clique aqui.

domingo, 6 de setembro de 2009

Lula na UNASUL

A transmissão ao vivo do encontro foi um marco, não tenho conhecimento de coisa semelhante em anos recentes. Do ponto de vista mais prático, creio que prejudica o entendimento, pois muitos líderes passam a jogar para a torcida, mas, enfim, aconteceu e gostaria de registrar aqui ao menos algumas boas palavras do Presidente Lula.

Cidade Maravilhosa

Belíssimo vídeo de divulgação do RJ para as Olimpíadas 2016. Se sou favorável? Creio que sim. É preciso, no entanto, transparência e controle nos gastos, coisa que não aconteceu no PAN e provavelmente não vai rolar na Copa.

Os candidatos e o Pré-Sal

Conforme este humilde blog vinha adiantando, os debates sobre o pré-sal ganharam finalmente as manchetes da imprensa. E, da mesma forma que vinha colocando, gradualmente as posições estão vindo à superfície. A crítica óbvia, e superficial, quase tola, de estatismo e apropriação eleitoral, foi imediatamente ecoada pelos de sempre. Mas, esses perderam credibilidade e não são mais formadores de opinião. O importante é saber o que pensam os pré-candidatos à Presidência.

O post a seguir foi colado do blog do Nassif. Um jornalista da família Marinho publicou notinhas com, supostamente, a visão do Gov. Serra. Hoje na Folha há artigos da liderança do Governo no Senado e do ACM Neto e mais um oposicionista fazendo o contraditório. ACM Neto joga para a torcida e seus argumentos são muito fracos. O artigo da liderança do Governo também mereceria alguns reparos, mas é muito mais consistente.

Enfim, para resumir o que acho relevante, creio que há razoável concordância sobre o modelo adotado. Eu estou de acordo. Depois posso entrar em mais detalhes que, afinal de contas, ainda podem atrasar a aprovação. Até a Economist não perdeu tempo com certa demagogia que permeia o discurso oposicionista. Leiam abaixo qual seria a opinião do Serra (detalhe que no tópica Serra apoia Lula há boas idéias, mas no debaixo enumera apenas fatos e obviedades)...

O que Serra pensa do pré-sal
Atualizado
O provável candidato do PSDB nas próximas eleições, José Serra, não pode se calar ante o pré-sal. Depois que declarou que qualquer lei aprovada agora poderá ser revogada pelo próximo presidente, ficou na obrigação de dizer o que pensa sobre o tema.

Líderes do partido e mídia aliada pensam o seguinte:

1. A exploração deve ser aberta a todos os candidatos.

2. Não se deve dar privilégios à Petrobras.

3. O sistema de partilha iguala o Brasil às nações atrasadas.

4. O fundo soberano não pode ter gestão pública.

São posições que irão marcar o discurso político nas eleições do próximo ano.

O que pensa Serra sobre isso?


Por Heberth Xavier
Nassif, o jornalista Ilmar Franco, da coluna Panorama Político, d’O Globo, publicou ontem:

“SERRA APOIA LULA

O governador de São Paulo, José Serra, apoia a proposta do presidente
Lula para o petróleo do pré-sal. Serra concorda com seu fundamento: o
de aumentar a participação da União na renda do petróleo. Ele usa três
argumentos: 1. o preço do petróleo explodiu nos últimos anos; 2. as
reservas petrolíferas não estão crescendo; 3. as reservas do pré-sal
têm um risco exploratório menor.

“O TUCANO NÃO FARÁ CAMPANHA CONTRA

José Serra, pré-candidato a presidente, está convencido que a mudança
é necessária. Sua avaliação é que é irrelevante o debate concessão x
partilha. Para Serra: 1. essa riqueza é da União; 2. Lula é o
presidente eleito; 3. Lula tinha a prerrogativa de decidir; 4. cabe ao
Congresso examinar a proposta. Um amigo de Serra conta que ele gostou
da fala da ministra Dilma Rousseff sobre a adoção do modelo de
concessão no governo FH. Dilma lembrou que, quando isso ocorreu, o
modelo era compatível com um país vulnerável às crises externas, com
uma Petrobras descapitalizada e com o elevado risco exploratório das
reservas”.

Portanto, Nassif, Serra parece juntar-se ao Mendonção e ao Bresser-Pereira no grupo daqueles economistas do PSDB que gostam, em linhas gerais, do modelo apresentado pelo governo Lula para o pré-sal. Claro, há críticas aqui e ali, mas parecem apoiar o modelo.

Os três, portanto, Nassif, deveriam se juntar aos aloprados que o jornal O Globo chamou de possuidores de um “delírio estatista”. São três comunistas, incompetentes, irresponsáveis, igualzinho sugeriu o editorial do jornal carioca para se referir aos responsáveis pelo marco regulatório encaminhado por Lula ao Congresso.

Do Baseline Scenario sobre trabalho mais elaborado do Krugman

Resumindo com estilo. O blog sugere aos interessados uma lida no artigo do nosso amigo nobel.

Krugman on Economics
with 87 comments

This weekend’s New York Times Magazine has the 7,000-word article about the state of macroeconomics that Paul Krugman has been hinting at for some time now. It’s a well-written, non-technical overview of the landscape and the position Krugman has been presenting on his blog, which for now I’ll just summarize for those who may not have the time to set aside just now.

Like many, Krugman faults the discipline for its infatuation with mathematical elegance:

“[T]he central cause of the profession’s failure was the desire for an all-encompassing, intellectually elegant approach that also gave economists a chance to show off their mathematical prowess.

“Unfortunately, this romanticized and sanitized vision of the economy led most economists to ignore all the things that can go wrong. They turned a blind eye to the limitations of human rationality that often lead to bubbles and busts; to the problems of institutions that run amok; to the imperfections of markets — especially financial markets — that can cause the economy’s operating system to undergo sudden, unpredictable crashes; and to the dangers created when regulators don’t believe in regulation.”

His history of post-Depression macroeconomics goes through roughly three phases: Keynesianism; Milton Friedman and monetarism, which, he argues, was relatively moderate compared to the positions of some of his self-styled followers; and the period from the 1980s until 2007, which he describes as the conflict between the Saltwater (coastal, pragmatic, New Keynesian) economists and the Freshwater (inland, efficient markets, neo-classicist) economists. According to Krugman, these two schools had differences on a theoretical level, but those differences were papered over by practical agreement on government policy: namely, monetary policy was superior to fiscal policy at managing the economy.

This false peace was exploded during the financial crisis by the zero bound, something Krugman has invoked often. The agreed-upon way to stimulate the economy in a recession is to lower interest rates. When interest rates hit zero, they can’t be lowered anymore (rather than lend you money and expect to get less back in the future, I should put it under my mattress), and then the policy question is what if anything else should be done. This provoked the fallout between people who favored the stimulus as a way of propping up demand and those who thought that for theoretical reasons a stimulus could not possibly have any positive impact.

In addition, Krugman argues, the two sides shared the same desire to represent the world using elegant mathematical models: “But the New Keynesian models that have come to dominate teaching and research assume that people are perfectly rational and financial markets are perfectly efficient.” Instead, we need to look to behavioral finance and behavioral economics, which has just gone from a hot fad in economics to the bandwagon to end all bandwagons. Krugman mentions Larry Summers’s “There Are IDIOTS” paper, which must now be the world’s most-cited-although-unpublished article, Robert Shiller, Andrei Schleifer, and Robert Vishny in particular.

This is from Krugman’s conclusion:

“So here’s what I think economists have to do. First, they have to face up to the inconvenient reality that financial markets fall far short of perfection, that they are subject to extraordinary delusions and the madness of crowds. Second, they have to admit — and this will be very hard for the people who giggled and whispered over Keynes — that Keynesian economics remains the best framework we have for making sense of recessions and depressions. Third, they’ll have to do their best to incorporate the realities of finance into macroeconomics.”

In other words, the world is messy and people are irrational, and as a result the world breaks down occasionally.

The field of economics has been going on a massive land-grab over the past few decades. It’s ironic that the area it seems to understand the least well is how an overall economy functions.

By James Kwak

sábado, 5 de setembro de 2009

E por aqui... I win, you lose... em alta!

E por aqui, ontem havia uma entrevista no Estadão de um ex-diretor do BC que hoje administra recursos dos muito muito ricos. Satisfeito com o COPOM, afirma que os juros deverão se manter estáveis até o começo de 2011. Incrível a bola de cristal dele. 2011 ???? Nesse momento de crise e incerteza ele está vendo 15 meses na frente. Ahhh, é o "risco político" das eleições. Está explicado então.

Os juros, repito, representam a 3a maior taxa real do mundo. 0,5% a menos deve dar uma economia anual de uns R$ 5 bilhões. Quedas movem a economia, geram renda, empregos, facilitam tudo. Risco de inflação? Meu Deus, IGPM deflacionário, câmbio valorizado, IPCA caindo.

"Mas a economia pode voltar a crescer excessivamente e pressionar os preços". Ok, se e quando isso acontecer a gente vê o que faz. Estamos a léguas de qualquer descontrole inflacionário. Os ricos estão em crise e os europeus em deflação...

O que acho mais engraçado, e me seguro para não ficar bombardeando isso todo dia, nem cito mais nomes, é que os argumentos do cara são travestidos numa linguagem técnica e racional, revestidos de uma autoridade que se supõe científica, uma arrogância sem fim. Fica com aquela cara de sujeito responsável, leitor de realidades que não conseguimos compreender.

Na prática, faz apenas o velho papel de repetir as platitudes que agradam aos estratos mais ricos da sociedade, que ainda irão lutar por algum tempo para permanecerem na confortável posição de rentistas. A turma do "I win, you lose".

Um novo modelo de crescimento... sustentável!?!?

VINICIUS TORRES FREIRE

Feliz aniversário, Wall Street

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Com subsídio estatal, mundo escapou da Segunda Grande Depressão; mas onde está o novo fator de crescimento?
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O RENOVADO presidente do Banco Central americano, Ben Bernanke, quase declarou ter salvo o mundo da Segunda Grande Depressão, durante o encontro estival de BCs, ministros de Finanças e economistas em Jackson Hole (Wyoming, EUA), no final de agosto. Stephen Roach escreveu que Bernanke se comporta como o médico que salva miraculosamente o paciente, doente no entanto quase desenganado por ter sido vítima de barbeiragens do próprio médico -Bernanke. Tido como espírito de porco contumaz, embora bastante certeiro, Roach preside o Morgan Stanley na Ásia, após longa temporada como economista-chefe do banco, quando fez fama de urubu.
Mas o mundo de fato não derreteu na Segunda Grande Depressão. Em boa parte, o desastre final foi pontualmente evitado devido às ações de Bernanke. Entre os estertores de Bush e a chegada de Obama, ele tomou conta do barraco quase sozinho. O fato de as condições materiais de vida serem muito boas e de o Estado de bem-estar social não ter sido desmontado ajudaram a evitar a Depressão e eventuais tumultos políticos (sobre "condições de vida muito boas": lembre-se de que, nos anos 1930, muita gente passou fome e frio mortal no mundo rico).
É verdade também que o "plano Bernanke" basicamente foi (aliás é) um programa em que o Fed toma o lugar de largas partes do mercado financeiro (que faliu ou fugiu) e subsidia largamente a banca privada. Por fim, os governos torraram dinheiro das próximas gerações (fizeram grossa dívida) a fim de subsidiar o consumo e limpar a sujeira de Wall Street e cia. "Sujeira" é um termo leve e adequado a um jornal familiar.
A finança mais poderosa, rica e sofisticada do planeta promoveu a maior e a mais incompetente, trambiqueira, falaciosa e corrupta alocação de recursos desde o início dos tempos. Isto é, essa gente investiu onde não devia, destruiu poupança, malversou capital, ficou com os lucros e deixou a conta para os trouxas. Neste quase ano completo do estouro final da crise, trata-se de um feliz aniversário para a banca.E para o resto? É difícil encontrar por aí um indicador econômico importante que continue a piorar. Ou melhor, alguns continuam a piorar, mas cada vez mais devagar, caso do desemprego americano. São agora mais raros os mercados, como o de imóveis comerciais nos EUA, ou de economias, como as do Leste Europeu e da Espanha, que ainda afundam. Parte importante da sensação de melhora, porém, se deve ao contraste com a "experiência de quase morte"; o doente continua ligado a muitos aparelhos para sobreviver.
O BC dos EUA, o Fed, sustenta ainda parte grossa do mercado de crédito nos EUA. O consumo privado se sustenta ainda com muito subsídio oficial. A produtividade e o lucro de empresas cresceu, como nos EUA, mas isso é corte de custos (demissões e queda de salários). Na recessão do início do século, bem mais benigna, os EUA saíram da crise com juros baixos e pendurados numa bolha, a imobiliária. Desta vez, quando e se acabar o subsídio público, de onde virá o dinheiro para impulsionar o consumo das ainda avariadas famílias dos EUA? Como o capital vai crescer -onde está a novidade do investimento privado?

sexta-feira, 4 de setembro de 2009

Refletindo sobre o blog

Estou pensando sobre esse blog. É possível que passe a escrever menos, porém com textos mais elaborados, pensados, não esse negócio de sair escrevendo na louca e postar. A conferir.

quinta-feira, 3 de setembro de 2009

Lei para internet no período eleitoral

Aprovaram um monstrengo aí numa Comissão do Senado. Vai a plenário agora.

Os detalhes dessa história devem ser engraçados. Este blog já avisa que, caso isso prossiga, irá desrespeitar a regra. Mas acho que nem vai precisar, difícil algo assim ir para a frente. Parece que há decisões no judiciário que já oferecem algumas idéias iniciais. Vamos acompanhar esse negócio aqui.

Como esperado

O COPOM manteve os juros. Tudo bem, era esperado, nenhuma surpresa. É razoável um tempo agora para avaliar como estamos e para onde vamos. 45 dias. Bola pra frente.

quarta-feira, 2 de setembro de 2009

Perguntar não ofende

São Paulo está em guerra civil?

A queda nas estatísticas de homicídios deve-se a mais prisões e presídios ou ao fato do PCC ter se estabelecido como poder paralelo e ter criado seus próprios tribunais? Ou seria fruto da melhora econômica e de programas sociais públicos e de ONGs na periferia?

Em Vitoria/ES

Cidade agradável. Clima bom. Trabalho foi legal, mas nada demais.

Sem paciência para falar de pré-sal. Está cheio de reportagens nos jornais. Algumas delas falam por si só.

Também sem a menor vontade de retomar o câmbio.

Quero mudar um pouco de assuntos.

Amanhã.

terça-feira, 1 de setembro de 2009

Tema de sempre

Bem, voltemos ao tema mais polêmico, um debate histórico no Brasil e atualmente em relevo, por razões óbvias. Câmbio, ora pois. O Governador José Serra outro dia deu declarações sobre possíveis danos a um Brasil especializado na exportação de commodities. Eu concordo inteiramente com ele. Não sei o que o Gov. Aécio e a querida Senadora Marina pensam sobre isso. Também tenho cá minhas dúvidas com relação à Ministra Dilma embora, a princípio, creio que ela acompanharia as observações do Gov. Serra. O IPEA, na última edição da Revista Desafios do Desenvolvimento, faz uma excelente discussão do tema do Brasil como exportador de commodities.

Hoje, na FSP, há matérias sobre o debate. Há inclusive um bate-bola entre a FIESP e o Professor de Deus. No Valor a coisa está num nível mais alto. A matéria do Valor é mais técnica, abrange não só o movimento do câmbio, mas a intensidade das oscilações. A reportagem aborda a tendência mundial de moedas de exportadores de commodities, a conversibilidade, o real moeda forte como consequência do desenvolvimento do país, impactos nas contas do governo, acúmulo de reservas, profundidade do mercado nacional, o carry trade, regulação, política monetária e metas de inflação. Fiquei com a impressão de que a matéria levantou excelentes bolas, uma pena que tenha faltado espaço para desenvolver tantas questões.

Com comentários no Valor, o Nelson Barbosa, Secretário de Política Econômica da Fazenda (SPE), mostra que é mesmo muito bom. O cara tem realmente a manha, conhece tudo, fala bem, sabe a hora de ser duro mas tem a humildade de se posicionar em torno de algo que reconhece como sendo controverso.

Vejam só o final da matéria. Palavras do SPE: "Só tenho uma certeza: seremos bem-sucedidos se acharmos uma solução brasileira, que pode ter inspiração em exemplos de outros países, mas não uma simples transposição de modelo..... há o debate e ele não quer dizer que vamos abandonar o câmbio flutuante... A arte da política não é escolher entre os extremos, mas administrar os trade-offs".

E eu completo: não estamos aqui falando de ciência. Nada é inevitável, nada segue a ordem natural das coisas, não existe ordem natural, mas sim escolhas, custos e benefícios, ganhadores e perdedores. Essa interdição do debate advogada por alguns ortodoxos, por boa parte dos analistas de mercado, é uma enganação. Da mesma forma, estão errados aqueles que vêem no mercado apenas um bando de especuladores malvados.

Economia política, economia e política, política e economia, Estado e Mercado.