quinta-feira, 10 de dezembro de 2009

A hipocrisia das grandes potências

Esse é o final da coletiva de imprensa da Chanceler Ângela Merkel e do Presidente Lula, que estiveram juntos na Alemanha faz alguns dias. Lula coloca o dedo na ferida da hipocrisia das grandes potências. Formam um exclusivo clubinho da morte, a high society do terror mundial, que prega a não-proliferação de armas nucleares mas se arroga o direito de manter arsenais capazes de devastar o planeta. Se ao menos avançassem no desarmamento, facilitariam as conversações que eles alegam tanto querer. Mas nem isso... Vejam aliás que bela intervenção do Presidente Lula.

Jornalista: Senhora Chanceler, a senhora mencionou que também falaram sobre o Irã. Gostaria de saber se acredita que o Brasil pode... quer dizer, se o Brasil... os estados europeus têm a mesma perspectiva no que se refere ao problema. Gostaria de saber do senhor Presidente como é que avalia a visita do presidente Ahmadinejad ao Brasil, que foi vista com alguma crítica aqui, a partir da Europa. Eu me informei sobre a visita do... (Interrupção no áudio) ...realizar determinados objetivos.

Presidente: Olha, o melhor e o mais barato para todos nós é acreditarmos nas negociações e termos muita paciência. Eu penso que tratar o Irã como se fosse um país insignificante, aumentando a cada dia a pressão sobre o Irã, poderá não resultar numa coisa boa. Como o Irã é um país de uma cultura muito forte, de 80 milhões de habitantes, com problemas internos muito grandes, nós precisamos aumentar o grau de paciência, para aumentar o grau de conversação com o Irã. Eu tive a sorte de, na mesma semana, ter o Presidente de Israel, o Presidente da Autoridade Palestina e o Presidente do Irã. Conversei muito com cada um deles, e eu penso que há sempre uma brecha para que a gente encontre um jeito de as pessoas concordarem que a paz é muito mais barata e muito mais eficaz do que a guerra.
Portanto, eu já conversei isso com a minha querida amiga Angela Merkel hoje; conversei com o presidente Obama, em Pittsburgh; conversei com o Sarkozy, conversei com o Gordon Brown: é preciso estabelecer uma nova linhagem, um novo tipo de conversação para ver se a gente diminui o grau de desconfiança generalizada existente hoje; cria-se um clima de confiança para a gente poder sonhar com a negociação.
E a minha posição é muito clara. O meu país tem, na Constituição – não é uma decisão do governo –, está aprovado na Constituição brasileira, feita em 1988, que é proibida a utilização de armas nucleares. E nós, no Brasil, temos enriquecimento de urânio para produzir energia elétrica. E o que nós queremos com o Irã? É o mesmo que o Brasil tem. O mesmo que o Brasil aceita para si, nós aceitamos para o Irã.
Eu acho que somente [com] a conversa é que a gente pode fazer uma concertação capaz de criar um clima de concordância ali, no Oriente Médio. Eu não sei se sou ingênuo, não sei se sou muito otimista, mas eu acredito muito, muito, na capacidade de convencimento e de diálogo das pessoas. Nós estamos tentando dar a nossa contribuição, e eu espero que aconteça o melhor, que não tenha arma nuclear no Irã e que não tenha arma nuclear em nenhum país do mundo. E que os Estados Unidos desativem as suas, que a Rússia desative as suas, porque autoridade moral para a gente pedir para os outros não terem, é a gente também não ter.
Então, é importante... Eu sou um país que assinou, na Constituição, a não proliferação de armas nucleares. Portanto, eu estou muito tranquilo para dizer. Agora, é importante que os que têm comecem a desmontar os seus arsenais, para que a gente tenha mais argumentos para convencer os outros.

2 comentários:

  1. Antônio,
    Sou um Engenheiro que dedicou a vida profissional ao petróleo. Por isto fui levado a estudar a sua Geopolítica e influência na evolução da Economia mundial nos últimos 200 anos.
    No final do Século 19, os Grandes Impérios impunham o domínio sobre suas colônias com base nas suas "Canhoneiras", expressão máxima da tecnologia bélica disponível então.
    Foram apagados do mapa pela guerra de 1914 porque o carvão foi substitudo pelo petróleo. As armas tornaram-se mais rápidas e eficazes do que suas canhoneiras à vapor.

    A tentaiva de estabelecimento do Reich dos 1000 anos, em 1930, fracasou principalmente porque Von Rommel perdeu o controle sobre as resevas do Norte da África e Von Braum não conseguiu equipar seus foguetes com bombas atômicas.

    Sob esta perspectiva, me parece lícito que Ahmadinejad procure equipar os seus foguetes com ogivas nucleares, a fim de disuadir ataques aos campos de petróleo iranianos.

    Neste mesmo contexto, o longo pronunciamento de Lula soa um tanto ingênuo (ou disimulado), haja vista que a defesa do Pré-Sal, recomendaria, isto sim, um efetivo programa de reequipamento de nossas forças armadas, nem que fosse para fazer companhia à IV frota americana que voltou a singrar as águas do Atlântico Sul.

    Parabéns pela qualidade do seu Blog.
    Miguel Lampert

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  2. Pois é, Miguel, dissimulado, ou ingênuo, entendo perfeitamente seu ponto.

    Ingênuo porque sabemos que as grandes potências construiram seu poder em boa parte pela violência e não vão se desarmar unilateralmente. Concordo com isso, mas ao mesmo tempo me orgulho do discurso pacifista do Presidente Lula e de apontarmos o dedo para a hipocrisia das grandes potências. É uma tradição da política externa brasileira. No que se refere ao TNP, temos que é um tratado desigual (que aliás vai ser rediscutido em 2010).

    Dissimulado porque seria conveniente nós termos nossas próprias forças militares em condições de nos defendermos adequadamente, para tanto talvez até desenvolvendo armamentos nucleares. Com relação ao primeiro item, estamos reforçando mesmo nossa capacidade militar. Com relação ao segundo item, a Constituição proíbe e não creio que seria de nosso interesse nuclearizar o subcontinente. Mesmo que não chegássemos a esse ponto, até certa corrida armamentista na região seria equivocada. Para tanto, a diplomacia regional vem tentando erguer a Unasul, não sem milhares de dificuldades como não poderia deixar de ser. E além da IV Frota, temos uma base norte-americana na Colômbia. Eles não colaboram, é certo...

    Mundo cruel. Será mesmo que só poderemos nos sentir seguros quando tivermos a mesma capacidade de destruição das grandes potências? Alguém consegue imaginar a nação brasileira apontando armas nucleares para algum outro povo? A troco de que? Será mesmo que nos atacariam pelo petróleo? Nós vamos vendê-lo a quem quiser.

    Eu acho que sou também ingênuo e idealista. Espero que o futuro não me surpreenda. Recomendo a leitura do post sobre o Obama Nobel, aliás recomendo a leitura do discurso dele. Creio que é um bom homem, mas o establishment, a plutocracia norte-americana, o constrange.

    Enfim, obrigado por passar aqui, elogiar esse humilde e solitário blog e contribuir.

    Guerra e Paz, Liberdade e Igualdade, Indivíduo e Estado, são questões para as quais não tenho respostas fáceis.

    Abs,
    Antonio

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