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sábado, 15 de outubro de 2011

Reorientação no macro

Pois bem, no post abaixo sobre as notícias da crise comprometi-me a escrever sobre a reorientação programática na política econômica. O nome é péssimo, eu sei. Reorientação programática. Mas é porque não tem nome. Tem sido executada sem fanfarra. A despeito de ser um lance político de grande importância. Talvez mais para a frente tenhamos um nome, um sentido geral para essa mudança.

Enfim, prometi escrever a respeito e nada ainda. Nada ainda? Há diversos, inúmeros e repetitivos posts sobre a economia política da dobradinha câmbio baixo-juro alto. Vêm desde o início do blog. Quem ganha, quem perde.

Quero comentar mais para frente. Entretanto, no entanto, por enquanto, deixo trechos de recente entrevista do Bresser, que escreve tanto. Um cara prolífico, está aí guerreando nos meandros acadêmicos e das idéias. Entrevista muito boa. Disserta sobre vários assuntos, com aquela confiança de quem tem a experiência de antigas batalhas, o desprendimento de quem não está associado a projetos políticos específicos, muito menos projetos de ganho monetário. Há sim uma orientação geral pró indústria e mercado interno. Mas, enfim, qual país de porte no planeta não busca reforçar sua indústria e seu mercado interno? É bom senso.

Antes, apenas um comentário rápido sobre os movimentos Occupy Wall Strett, ocupem não-sei-aonde, sentem-se na praça, façam-se ouvir, discutam, satirizem. Creio que são muito positivos e vêm no momento certo. É claro que os problemas estão muito além da capacidade de articulação teórica e tradução em um projeto político concreto dessas manifestações. Mas é simbólico, é político, faz parte da caminhada. Deve crescer, será interessante observar seu desenvolvimento. Divertido também.

É no entrelaçamento entre a alta finança e a política que se encontra a chave para a compreensão de uma parte de nossas atuais dificuldades. É a máquina do sistema. Criar crédito, tomar do futuro para gastar e investir no presente. Gastar em que? Investir no que? E quem se apropria das rendas geradas por esse capital? E quem não se apropria? De que forma esses setores percebem esse processo? E como traduzem suas preocupações em propostas de políticas públicas? E como as instituições as recebem? Seu processamento, sua execução? Os resultados? Occupy Wall Street.

Vamos a trechos da entrevista do Bresser:


....

CARTA MAIOR: Com que o Brasil deve tomar cuidado nessa crise?

BRESSER: Dois problemas são dominantes no Brasil desde que a inflação foi controlada, em 1994: a alta taxa de juros e a taxa de câmbio sobreapreciada.

CARTA MAIOR: A inflação não voltou a preocupar?

BRESSER: A inflação não é um problema fundamental. Claro que temos sempre de estar preocupados com isso, mas este, hoje, não é nosso problema principal. É importante apenas para quem gosta de juros altos. Como tínhamos problemas para resolver a inflação entre 1980 e 1994, desde 1994 nosso problema passou a ser uma taxa de juros e uma taxa de câmbio anormais. A boa notícia é que o governo, nesses últimos meses, resolveu afinal dar uma guinada para uma política keynesiano-estruturalista, ou desenvolvimentista, o que dá esperanças.

...

CARTA MAIOR: Existe, por parte do governo, algum plano estruturado de desenvolvimento, ou as coisas estão acontecendo por erro e acerto?

BRESSER:
Nas economias capitalistas como a nossa, não faz sentido ter um plano integral. O que é fundamental é que o governo planeje duas áreas: infraestrutura e indústria de base, ou indústria pesada. E administre com mão de ferro o setor financeiro. São esses três setores que exigem planejamento. As decisões sobre infraestrutura, como as hidrelétricas que estamos fazendo, demoram anos para serem colocadas em funcionamento e grandes somas de capital. Isso exige um planejamento que o mercado não tem a menor condição de fazer. O resto da economia – a indústria de transformação, a agricultura em geral, o comércio etc –, isso é mercado, e mais mercado, e mais mercado. Porque aí nós temos empresários, profissionais e trabalhadores competentes. Aí, funciona. A regulação e o planejamento são fundamentais nesses três setores.

CARTA MAIOR: O Banco Central de Alexandre Tombini tem esse perfil?

BRESSER:
O Banco Central é um banco do governo, é parte do governo e tem que fazer a política do governo. Essa história de autonomia do Banco Central não faz nenhum sentido. O objetivo do BC é manter o sistema financeiro como um todo sob controle. Ou seja, não só combater a inflação, mas impedir que exista crise financeira. O BC dos Estados Unidos (o Fed) fracassou ao não evitar uma crise bancária. Além da crise bancária, o Brasil tem que evitar a crise de balanço de pagamentos. E por que nós temos crise no balanço de pagamentos, e eles não? Porque eles tomam emprestado na sua própria moeda – não apenas os Estados Unidos, mas os países ricos, com essa exceção maluca que são os países da Zona do Euro, que não é propriamente a sua moeda. Enquanto nós crescermos com poupança externa, estamos tomando emprestado em outra moeda, que não temos condições de emitir. Por isso, além de contribuir para o equilíbrio econômico, o Banco Central tem essas três funções: controlar a inflação e evitar esses dois tipos de crises financeiras.

CARTA MAIOR: Essa quase concordância que se percebe hoje entre Banco Central e Ministério da Fazenda, então, não é ruim para a economia?

BRESSER:
Não coloca nada em risco. Nós temos um bom economista no BC – ou bons economistas, no plural. O Tombini me parece muito seguro, eu não o conheço pessoalmente mas causa boa impressão. Ele se baseia na experiência recente da Turquia. Aquele país, durante muitos anos, manteve uma grande competição com o Brasil para ver quem tinha juros mais altos. Geralmente a gente ganhava, é lógico, mas a Turquia chegava perto (risos). Até que, há uns quatro ou cinco anos, aproveitou um certo desaquecimento da economia e fez uma baixa de juros firme, levando-os para níveis internacionais. E aí a inflação não se moveu, a taxa de câmbio depreciou 40% e a economia turca está bombando. Essa coisa eu não estou inventando. Eu li isso numa entrevista que o Tombini deu para a Folha há umas três semanas.

CARTA MAIOR: E a questão fiscal, que continua a ser discutida como se fosse o fim do mundo?

BRESSER:
Existem dois tipos de economistas horríveis: os ortodoxos, para os quais todos os problemas do mundo se resolvem com mais ajuste fiscal, e os keynesianos vulgares, para quem tudo se resolve com mais gasto público. É uma burrice. O Brasil atingiu todos os seus objetivos fiscais nesses anos todos – exceto em 2009, o que estava perfeitamente correto – acordados, combinados etc, e no entanto continuam reclamando. Não é esse o problema.

CARTA MAIOR: Esse é um discurso politico, então?

BRESSER:
Também é um discurso politico, mas é um discurso burro. A burrice ortodoxa é a formulinha pronta: qualquer problema resolve-se cortando a despesa pública. Tem um movimento ideológico, simpático, porque se diz que com a redução do Estado os impostos vão diminuir. E aí o keynesiano vulgar pensa: todos os problemas se resolvem aumentando o gasto público. Às vezes o problema é a área fiscal mesmo, que nunca pode ser desleixada. Mas, no Brasil, nós não estamos descuidando disso. Desde 1998 o Brasil vem adotando uma política fiscal correta.

CARTA MAIOR: O problema, então, são os juros e o câmbio?

BRESSER:
O problema macro, sim. Existem outros também. O país tem mil problemas do lado da oferta. Mas o fundamental, que mudaria o quadro do Brasil de maneira enorme em pouco tempo, é o ajuste de juros e câmbio. Oferta é muito importante, tem efeito de médio prazo, não de curto prazo, e está sendo cuidada.

CARTA MAIOR: Não na velocidade que se desejaria.

BRESSER:
De fato. Eu tenho dito que o Brasil, depois da redemocratização, caminhou muito fortemente na própria democracia, e portanto nas liberdades, e melhorou muito na área social. E a parte econômica foi devagar. O nosso desenvolvimento social foi substancialmente melhor do que o nosso desenvolvimento econômico. Os dois caminham mais ou menos juntos, mas às vezes um vai na frente e o outro, atrás. No tempo dos militares, o econômico ia na frente do social. Nós invertemos. Foi bom, mas eu gostaria que os bons resultados na área social fossem acompanhados por bons resultados na area econômica.

CARTA MAIOR: Na parte econômica, estamos na direção certa?

BRESSER:
A questão internacional é muito importante e tem repercussão sobre o Brasil. E refletirá principalmente sobre o Brasil conforme atingir a China. A China acabou de tomar medidas de intervenção, comprando mais ações dos grandes bancos, que já são estatais, porque sua bolsa de valores está caindo. E isso é preocupante.

Os analistas estão dizendo que a China vai reduzir seu crescimento de 11% para 9%. Isso está bom ainda, mas se for de 9% para 5% nós estamos mal-arrumados. O bom foi que o governo brasileiro percebeu isso e se antecipou. A dona Dilma, o seu ministro da Fazenda e o seu presidente do Banco Central estão de parabéns.



Comentário rápido sobre um ponto, o penúltimo. Bresser avalia que após a redemocratização o econômico andou mais lento que o político e o social. É um comentário interessante e a princípio tendo a concordar. Talvez com a crise da dívida nos anos 1980, o problema inflacionário, complicamo-nos logo de início. Depois com o Plano Real desperdiçamos uma excepcional oportunidade e nos deixamos levar por interesses de curto prazo muito estreitos. Avanços sim por alguns lados, com retrocessos em outros aspectos, como Bresser aponta no caso do câmbio e dos juros e dos interesses por trás disso. Nosso amigo regozija-se com a aparente correção de rota que Dilma e as autoridades econômicas vêm ensaiando empreender. Eu também acho positiva, vamos aguardar mais.

E, claro, não posso deixar de apontar a referência para riscos na economia chinesa na última resposta. Poderia escrever 10 páginas a respeito. Mas não aqui, hoje, né? No futuro sim, certamente.

domingo, 2 de outubro de 2011

Notícias da crise (o retorno dos que nunca foram)

Notícias da crise. Mas não, não pretendo comentar sobre o cenário internacional. Domingo pela manhã em Pequim, dia de sol e céu azul, embora esteja esfriando. Ontem tivemos o 62o aniversário da Revolução na China, muy bien, molto benne, hen hao. O Partido desfila soberano, envelhecido mas muito forte, cheio de si.

Pois então. Hoje acordei cedo, de boa, me sentindo bem. É feriadão essa semana, mas precisarei trabalhar um pouco, escrever algumas coisas, ler diversos textos, arrumar minha mesa que é uma zona indescritível. Mais visitas chegam hoje aqui em casa. Um casal. Visitas têm se sucedido. É bom receber gente e é bom saber que todos saem muito felizes de Pequim.

Bom, domingão pela manhã, já estourei os neurônios e estou a fim de falar sobre nosso amado Brasil. Em particular, sobre o que vem se revelando uma gradual reorientação da política econômica conduzida pela Presidenta Dilma Rousseff. O timing da mudança, a forma de implementação, as previsíveis críticas que têm sofrido, os reais riscos que corre, divagar um pouco sem maiores compromissos.

Abre parêntese. Tenho acompanhado muito mais de perto, por óbvias razões, a economia e a política chinesa. As coisas aqui têm atingido um estágio realmente fascinante. A proximidade da sucessão política chinesa em 2012-2013 e os desafios e riscos do atual modelo de crescimento econômico chinês entrelaçam-se num jogo nebuloso, muito rico, rivalidades entre grupos de interesse e facções, disputas ideológicas de uma sociedade que se transforma em todos sentidos, mas mantém rigidez em seus processos políticos.

Porém, é preciso ressaltar: é mais do que uma transição política, é uma transição entre gerações. A 5a geração, representada por Xi Jinping, Li Keqiang, Wang Qishan, Bo Xilai e outros, tem formação mais heterogênea (direito, economia, ciência política; a 4a foi dominada por engenheiros). São mais jovens, porém ainda contam com a experiência da Revolução Cultural (a 6a geração será a primeira sem nenhum contato mais próximo com aqueles anos). Serão os primeiros não diretamente bancados por figuras do porte de Mao ou Deng, mas sim resultado de uma burocracia poderosa e razoavelmente bem institucionalizada. Terão responsabilidades fantásticas que valeriam um ou cinco ou centenas de textos.

A cerâmica chinesa, cujos traços apenas pincelei acima, se torna caledoscopial quando colocada na moldura mais geral de recursos naturais cada vez mais escassos, uma economia global em crise, a falta de liderança e modelos e rumos nesse processo de rearranjo político internacional, as dificuldades do chamado mundo ocidental e a ascensão da Ásia. Um corpo desconhecido, um corpo em mudança, um gigante orgulhoso, se insere num meio internacional instável, ancorado em equilíbrios precários, cujas bases financeiras e ideológicas estão sob ceticismo crescente. Movimentos tectônicos na política internacional.

Devo citar, apesar dos pesares, que na região do leste e do sul da Ásia o xadrez político me assusta e acho tudo um saco. Todos estão se armando, rivalidades crescem, nervos se exaltam, andei lendo uns textos nas últimas semanas em parte da imprensa oficialista chinesa e me assustei. Eles são mesmo sensacionalistas, jogam para a torcida, mas assusta a naturalidade com a qual algumas coisas são abertamente discutidas. A despeito do aumento do comércio e dos investimentos regionais, e mesmo de sucessivas reuniões das lideranças locais, ocorrem lances de disputas de poder e revanchismo que só podem terminar mal, é tragédia anunciada...

Durante algumas oportunidades na minha vida tive a alegria de ouvir de algumas mulheres a doce expressâo "Me encanta...". Sob forma quase musical, hispanicamente entonada, me encanta, Antonio, doce e sorridente expressão. Pois bem, sobre o cenário de rivalidades asiáticas eu só posso dizer "Me espanta...", me espanta muito e quero estar longe daqui quando sobrevier alguma bobagem maior e o sangue começar a correr.

Mas, entretanto, porém, como disse, estou com vontade de falar sobre o Brasil. Estou gostando do primeiro ano de governo da PR Dilma. Ela tem demarcado grandes diferenças com relação ao Lula. Não apenas no estilo, o que sempre foi óbvio. Também programaticamente. Evidentemente, o cenário interno e externo é outro e isso força algumas mudanças. Falarei adiante.

Creio que as similitudes ficaram mais na necessidade de administração e aconchego da base governista e do PT, da relação com os outros Poderes, das disputas entre partidos e grupos que já se movimentam com vistas aos próximos anos. Mesmo nesse ponto há caminhos alternativos, como mostram as seguidas pontes que Dilma têm levantado com setores da oposição, particularmente com FHC. As elocubrações sobre reforma política e, em particular, do financiamento eleitoral. Na política externa, vejo ajustes de estilo, ajustes de foco, ajustes decorrentes de mudanças do jogo internacional, mas a orientação geral permanece e a qualidade da condução brasileira é inegável. Num mundo turbulento e perigoso, a voz brasileira é sempre um alento. Sensata, amigável e atenta para a desordem atual e os riscos que isso traz para o desenvolvimento nacional.

É no que chamei de programático, quero dizer, mais do que na gestão, na orientação geral de determinadas políticas, que desejo me alongar. Em particular, no que se pode começar a pensar em chamar de transição macroeconômica. Os juros foram baixados, contrariando as expectativas dos nossos amigos do mercado. A meia-dúzia de seis mil sobre o qual já comentei tanto aqui. Em geral excelentes profissionais, mas muitas vezes um tanto quanto descompromissados com a nação. Enfim, os juros baixaram e a gritaria foi grande. Hoje parece tudo mais tranquilo. Encaixaram.

Dilma é muito respeitada, vem ganhando uma espécie de autoridade diferente da de Lula. É inevitável voltar ao tema do estilo. Lula equilibrava, seu carisma construía diferentes discursos para diferentes multidões, confiança, apelo à emoção. Dilma organiza, avalia, opera à distância. Não sofre os tipos de ataques que Lula sofria (e sofre), muitos deles verdadeiramente vis. Afastou ministros sem conversa-mole. Não fica com papinho ao léu com quem não se tem o que conversar.

Lembro-me de um dos grampos da Satiagraha, creio, operação em que a Justiça em particular, mas o establishment político, econômico e midiático nacional em geral, acharam por bem silenciar. Lá pelas tantas, um dos grampeados, num daqueles diálogos bem republicanos compilados, referia-se à Dilma, então ainda Ministra. Após uma reunião na Casa Civil, os interlocutores teriam ficado impressionados com a esperteza dela, principalmente em descobrir onde estava "a sacanagem".

Pois é, Dilma parece que sabia onde estava a sacanagem, parece que sabe onde está a sacanagem. E ela não gosta muito de sacanagem. Embora algumas estejam fora de seu alcance, nossa Presidenta tem atuado bem no que lhe diz respeito mais diretamente. Ela passa uma imagem pública muito boa. O Brasil precisa de exemplos que venham de cima. Volto ao ponto do diálogo com FHC. Dilma institucionaliza o país, dá um sentido de continuidade maior do que o lulismo permite. Muito bem, Dilma. Ampliando o Brasil, não sem deixá-lo mais complexo, mas também fascinante.

Mas onde está a sacanagem, povo brasileiro? O famoso "Brasil, mostra a sua cara... quero ver quem paga..." Na apropriação de recursos públicos, apropriação de poder, por entes privados, por pequenos grupos, sob a capa do interesse mais geral ou mesmo sob o comodismo da inércia histórica. Não se trata apenas da licitaçãozinha, da propina do fiscal, essas denúncias da TV com câmeras escondidas. Nem também da Castelo de Areia, da Satigraha. É mais. Trata-se da definição de políticas, da atribuição de responsabilidades, da distribuição de perdas e ganhos, do modelo mais geral. Onde também, como no caso da licitação ou da propina, há corruptos e corruptores. Via de mão dupla, é sempre bom lembrar. Teremos um modelo que permita a progressiva incorporação dos setores mais desfavorecidos e a ampliação das liberdades positivas (o direito de criar, elaborar, escolher caminhos) ou será mantida apenas uma máquina de reprodução da riqueza e manutenção da ordem para setores minoritários? Vamos além na democratização da sociedade ou paramos na forma, no discurso e no ajuste fiscal?

Volto, retorno, retomo: entre muitos outros pontos que considero bem importantes, fico com um exemplo no qual Dilma sinalizou e paralelamente opera mudanças positivas, uma brisa de ar nas esperanças de avanços políticos e econômicos.

Trata-se do que alinhavei acima como transição macroeconômica: a queda nos juros, especialmente; a diminuição das despesas com juros permite a manutenção dos níveis da dívida pública em paralelo a aumento nas transferências de renda e esperados reforços à taxa de investimento; vocalização, e atuação aqui e ali, na proteção do mercado nacional e no suporte à indústria e às exportações; tem se discutido também novo código de mineração, imagino que o controle sobre a propriedade fundiária esteja sendo aperfeiçoado; enquanto isso, no Congresso, segue a discussão sobre os royaltes do petróleo. Em debate, parte do que se conhece como federação brasileira.

Vou ficar na queda dos juros, na queda-de-braço com os mercados, na esfera da alta finança, na especulação com ativos em moeda nacional para que se atinja o fim último de se converterem em riqueza universal (dólar). Taí um setor em que tem muita sacanagem. Altas doses de cinismo e hipocrisia. Um jogo pesado. Dilma operando bem nesse meio. Boa, Presidenta.

Porém, mais tarde. Dia de sol e céu azul em Pequim. Easy rider pelas ruas e vielas da capital do Império do Meio. Vida louca, vida breve. Ars longa, vita brevis, já escrevi isso aqui. A continuar...

sábado, 20 de agosto de 2011

Aliança contra a miséria

Editorial do Estadão. Em política, como no amor, sempre há espaço para surpresas

Aliança contra a miséria

O cálculo de interesses é inseparável da ação política, quando não o seu mais potente motor. Ali onde deixou de ser conduzida predominantemente pelo confronto ideológico, a atividade tende a se pautar, para a imensa maioria dos seus praticantes, pela busca de ganhos que pavimentem o caminho ao que, afinal, conta acima de tudo nas democracias: a conquista do voto popular. Em tese, portanto, nada a objetar à permanente preocupação dos políticos com o custo-benefício eleitoral de suas decisões.

O problema, evidentemente, são os meios a que recorrem para acumular vitórias na vida pública e os esquemas de que se valem para aliciar parcelas do eleitorado suficientes para lhes conferir poder. Embora menos frequentemente do que seria de desejar, às vezes as artimanhas dos políticos para a promoção dos seus interesses acabam se traduzindo em atos e situações de genuíno benefício para a sociedade - e não apenas para os mais aptos entre os grupos de pressão que nela competem pelos diversos tipos de recursos que o Estado pode proporcionar.

Dessa perspectiva, teve literalmente tudo para ser bem recebido pelos brasileiros o evento da quinta-feira no Palácio dos Bandeirantes, que reuniu a presidente petista Dilma Rousseff com os quatro governadores do Sudeste, na companhia do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, convidado pelo anfitrião tucano Geraldo Alckmin para o lançamento do programa Brasil Sem Miséria na região, em regime de parceria. De fato, como disse Dilma, resumindo com propriedade o espírito da ocasião, "o Brasil sonhado por todos nós pode ser diferente em muitos aspectos. Porém estou certa de que ele é semelhante nas questões fundamentais".

Uma delas, evidentemente, é o imperativo de impedir que as diferenças de aspirações e os conflitos políticos delas decorrentes desbaratem a civilidade política. O ex-presidente Lula, por exemplo, passou boa parte de seu governo, sobretudo depois do escândalo do mensalão e quanto mais se aproximava a temporada sucessória, pregando o oposto. O Brasil por ele descrito era um país polarizado entre "o povo pobre" e as "elites egoístas", cujas respectivas posições diante das questões fundamentais não poderiam ter, por definição, nenhuma semelhança.

O mentor de Dilma, que assumiu dizendo ter recebido uma "herança maldita", deve ter ficado assombrado quando ela reconheceu que os êxitos do governo Fernando Henrique, em especial no combate à inflação, foram o que permitiu ao sucessor desenvolver os seus celebrados programas sociais. Além de fazer justiça ao tucano, a forma carinhosa como desde então o vem tratando - como se tornou a ver ainda agora nos Bandeirantes - decerto é uma fonte de azia para Lula. Tanto que, repetindo a indelicadeza de não aparecer no Planalto para o almoço com o americano Barack Obama, ele recusou o convite de Alckmin para o encontro de anteontem.

Não foi o único. O ex-governador José Serra, crítico do Brasil Sem Miséria e rival de Alckmin, fez o mesmo. Na contramão da linha seguida pelo antecessor no campo das políticas públicas, Alckmin pontilhou estes seus oito primeiros meses de mandato com uma série de iniciativas afinadas com as do governo federal, copiando algumas delas. "Ultrapassamos o período de disputas", afirmou, dirigindo-se à presidente. "Isso se deve ao seu patriotismo, generosidade e espírito conciliador." O grupo de Serra atribui o dilmismo de Alckmin à expectativa de recursos da União para programas que o ajudariam a se reeleger em 2014.

De modo parecido, Dilma estaria interessada em estender a mão ao PSDB não apenas em nome do "grande pacto republicano e pluripartidário" para levar adiante a "faxina contra a miséria", como declarou, mas também para manter a oposição no Congresso em fogo brando - já não lhe bastassem as atribulações com a base aliada. Mas os cálculos dos políticos envolvidos não mudam o essencial: a necessidade de engajar os Estados no combate à pobreza extrema (renda familiar mensal per capita abaixo de R$ 70). Mesmo em São Paulo, 1 milhão de pessoas vivem assim. No Sudeste todo, são mais de 2,7 milhões. A causa justifica o entendimento.

sábado, 13 de agosto de 2011

A Crise Revisitada

Pois é, pois é, bidu. Meus amigos, a preguiça grassa, e vou nos poupar de links antigos, comentários passados, elocubrações remotas. Cansei de alertar para os riscos à frente, a tibieza regulatória, a falta de coordenação e liderança internacional, o predomínio dos lobbies da alta finança contrarrestando as necessárias reformas, tantas coisas...

E agora culpam os governos. Mas ora, os governos estiveram e estão capturados pelo mercado, pelos magos da multiplicação financeira.

Governos também erraram e erram, são desgovernos, sem idéias, submissos, incapazes, é vero.

Mas o cinismo de parte das elites européias e norte-americana é impressionante. Jogarão a conta nos mais pobres, nos que estiveram e estão fora da ciranda, e afundarão ainda mais seus países na recessão.

As coisas não estão simples no cenário internacional. Um grande desarranjo. Como Stiglitz colocou: "A confiança voltou. A confiança de que tudo vai piorar."

E não limito esses comentários à questão dos mercados, da crise das dívidas, da crise de demanda. A política internacional, tantos nos temas multilaterais, como nos cenários geo-estratégicos dos planos regional e bilateral, em muitos casos, está só piorando.

A população cresce, os recursos são escassos. Eu acordo todo dia em Pequim, olho para o céu, e lamento pelo milagre do GDP growth. Nossos amigos chineses seguem cada vez mais rápido, mas para onde mesmo?

"Parem o mundo, eu quero descer" já dizia algum grande poeta.


sábado, 29 de janeiro de 2011

Velha História

Que vontade de falar da Tunísia, do Egito, do Yemen, da Jordânia e de outros lugares! Força aos egípcios, ainda que não dê pra saber o que teríamos num momento pós-Mubarak. Estou aqui ansioso esperando o dia nascer no Cairo para ver o que teremos hoje. Admirado com a coragem dos civis nas ruas.

Mas o blog volta para onde nunca saiu, tema ao qual recorre recorrentemente correndo ao redor do recorde. O governo Dilma ainda dá seus primeiros passos, mas fica a impressão que na política monetária, com fortes impactos sobre a política fiscal, o nível de emprego e a distribuiçao de renda, ficaremos com mais do mesmo, ao menos nesse primeiro ano. Ó vida, ó céus.

Uma economia viciada em juros elevados?
por Antonio Corrêa de Lacerda

O Estado de S. Paulo – 24/01/2011

O governo terá de ter cuidado na calibragem do aumento de juros, por dois principais motivos. O primeiro é que o Brasil já pratica a maior taxa de juro real do mundo e é preciso avaliar corretamente qual a necessidade de elevá-la ainda mais. A taxa Selic, que acaba de ser aumentada para 11,25% ao ano, representa um juro real de 5,5%, quando descontada a inflação prevista para os próximos 12 meses. Isso é mais do que o dobro da média dos países em desenvolvimento e é incompatível com a melhora de todos os indicadores macroeconômicos da economia brasileira nos últimos anos.

O segundo ponto é que é preciso caracterizar claramente a causalidade da inflação atual, que decorre muito mais de choques de oferta do que de pressões de demanda. Grande parte da elevação de inflação decorre de fatores cuja influência da taxa de juros é muito limitada, para não dizer nula, e os quais não controlamos diretamente. É o caso do aumento observado no mercado internacional de commodities, basicamente grãos, combustíveis, metais e outros, que decorre não apenas do crescimento da demanda, mas também de especulação nos mercados financeiros internacionais.

As commodities se tornaram ativos disputados como alternativa de investimentos de grandes fundos, especialmente diante do quadro atual de baixíssimas taxas de juros na maioria dos países. Há ainda fatores sazonais internos, como o impacto das temporadas de chuvas que geram uma inflação localizada e episódica, também descolada de um aumento da demanda que exigisse medidas de contenção.

Seria um erro de diagnóstico, a partir dessas pressões, concluir equivocadamente que seria necessário aumentar a taxa de juros para combatê-las. Depois de um crescimento próximo de 8% em 2010, a economia brasileira deverá se acomodar nos próximos anos, com um crescimento mais perto dos 5%. Naturalmente já está havendo uma desaceleração da taxa de crescimento, o que também vai ocorrer com a restrição de crédito decorrente de medidas que foram tomadas anteriormente pelo governo.

Por último, mas não menos importante, é preciso destacar que o aumento de juros não se trata de uma medida neutra, pois causa tanto efeitos deletérios para a economia produtiva como promove a geração de lucros especulativos no mercado financeiro.

Há um verdadeiro lobby pró elevação de juros, orquestrado por parte daqueles que se beneficiam com a medida, como os credores da dívida pública, que são todos os que aplicam direta ou indiretamente em títulos da dívida pública, e o próprio mercado financeiro, que é intermediário do processo. Como parte desses títulos são pós-fixados, o aumento de juros representa diretamente uma elevação dos seus ganhos.

Não é por acaso que frequentemente assistimos a um aparente “consenso” pela elevação dos juros ou pela sua manutenção em níveis elevados. Há interesses fortíssimos envolvidos que acabam influenciando a opinião pública. Muito pouco se questiona a respeito da real necessidade de manter taxas de juros tão elevadas e, menos ainda, de elevá-las ainda mais. Há um claro processo de acomodação, como se a economia, outrora viciada em inflação, a tivesse substituído pelos juros altos.

Os dados são impressionantes. Como a dívida pública brasileira é da ordem de R$ 1,5 trilhão, seu financiamento tem custado cerca de R$ 190 bilhões ao ano. São recursos que pagamos sob a forma de impostos que o Estado arrecada e transfere aos seus credores.

Cada ponto porcentual de elevação da taxa de juros representa, potencialmente, um gasto adicional de R$ 15 bilhões a cada ano. Isso é mais do que o custo anual de todo o Programa Bolsa-Família, para se ter uma ideia do estrago para as contas públicas.

É muito importante que o Banco Central tenha autonomia, relativamente, ao governo. Mas é também fundamental que não se mantenha refém de movimentos especulativos que privilegiam uma pequena camada da sociedade em detrimento do interesse coletivo.

Por todos os motivos apontados, já passou da hora de uma mudança expressiva. Isso vale tanto para paradigmas que têm que ser questionados, como o piso para a redução dos juros no Brasil, quanto ao sistema de metas de inflação em si, que deve ser preservado, mas precisa ser aperfeiçoado. Há muito a ser feito, desde os indicadores e o prazo para o foco da meta, até a forma de captação das “expectativas” dos agentes do mercado.

É também urgente rever o elevado grau de indexação da economia brasileira, especialmente das tarifas públicas. A correção automática de preços baseada em indicadores que têm pouca relação com a estrutura de custos dos setores, como é o caso do IGP e do IGP-M utilizados na maioria dos contratos, representa uma anomalia, incompatível com a nossa realidade atual.

quinta-feira, 30 de dezembro de 2010

Idéias de fim de ano

Um pouco de economia política & política internacional. Três bons artigos, dois sobre os EUA, um sobre o quadro geopolítico atual.

Aqui, Krugman fala sobre alguns mortos-vivos que vagam nos altos círculos norte-americanos. O comentário de Sachs segue a mesma linha geral, porém é menos conceitual, abrindo as cortinas de jogos de interesses, alternativas, opções de suas elites, no enorme teatro que rege a política norte-americana. Por fim, José Luis Fiori elabora sobre o que habilmente compara a um calesdocópio mundial, o jogo político internacional mais amplo, a retomada de um certo balanço ainda incerto, cheio de riscos, processo que reconfigura para caminhos mais vastos e desconhecidos o cenário global e as perspectivas para o século.


chamo a atenção para o post logo abaixo, música para ouvir e apreciar, boa hora...

terça-feira, 30 de novembro de 2010

sexta-feira, 12 de novembro de 2010

G-20, Dilma, Viagens em Sichuan, poeta Tu Fu, Mongóis, Japas, Li Bo, etc...

A reunião do G-20, como previsto, não deu em muita coisa nova, apenas confirmou o que já se sabia. A despeito de um pequeno avanço no FMI e de questionáveis aperfeiçoamentos no arcabouço da Basiléia, a economia e a política internacional, em sua dimensão multilateral, estão em grande crise. Os capitais prosseguem voando desvinculados da produção. As dívidas soberanas européias são um grande problema. Os sistemas financeiros norte-americano e europeu prosseguem sendo umas porcarias sustentadas pelos Estados. É provável que os problemas se aprofundem.

O Brasil deve se precaver. Jogo pra gente grande. Tenho uma teoria sobre o Governo Dilma. Mas vou aguardar um pouco para escrever. Adianto que talvez seja possível que ela inverta a equação usada por Jânio e em alguma medida por Lula. Ousadia no exterior, certo conservadorismo na política interna. Dilma de repente pode trocar de lado algumas variáveis, mudar nuances. A ver. Especulações.

Sichuan, como já escrevi, é uma província de vastas e férteis planícies cercadas por montanhas, bem no interior da China. Terra de florestas. Terra dos pandas. Irrigadas pelos rios que descem do teto do mundo.

Os mongóis a conquistaram durante o Século XIII. À época, os chineses estavam divididos entre duas dinastais, os Song, mais ao sul, e os Jin, mais ao norte. Os Song se aliaram aos mongóis para derrotar os Jin. Derrotaram-nos. Mas os mongóis gostaram da China. E aí invadiram os territórios dos Song. Ficaram até 1368, pouco mais de 100 anos de domínio. Iniciou-se então a Dinastia Ming.

Já os japoneses não conseguiram invadir essa região durante a II Guerra. Conquistaram a Manchúria, Pequim, Xangai, toda a costa leste. Chegaram perto de Chongqing, mas de lá não passaram. A resistência aos japoneses uniu os comunistas e os nacionalistas. Logo após a II Guerra, derrotados os japoneses, foi retomada a guerra civil chinesa.

Bom, o post tá meio bagunçado. Fotos do Museu de Sichuan e do parque onde viveu o Poeta Tu Fu, mestre da Dinastia Tang (600-900 d.C.), Poeta-Historiador, Poeta-Sábio. A estátua é de nosso amigo Tu Fu que, segundo o pessoal que conhece, é um dos grandes poetas chineses ao lado de Li Bo. Ambos viveram durante a Dinastia Tang (618-907), considerada o auge da poesia chinesa. Até teriam se encontrado duas vezes. Enfim, viajando no post, mas mostrando que devagarzinho vou aprendendo umas coisas sobre a China antiga. Viajar é preciso.

Então, em primeiro lugar, nosso amigo Tu Fu.

pois é, não consigo fazer o upload das fotos... separei 10... vai ficar pra outro dia...

quarta-feira, 10 de novembro de 2010

Avanços

Abri a internet agora e vejo que o Mantega propõe ampliar o uso dos SDRs. O Brasil deseja ainda menções mais firmes a controles de capitais. Muito boa. Os porta-vozes de sempre hão de questioná-lo, já se sabe. Mas é um bom sinal para o futuro Governo da Dilma. Quando devem ser aprofundadas políticas bem sucedidas do governo Lula. Entre elas, domar a sanha dos mercados.

Tô devendo muita coisa pra escrever, se é que alguém tem interesse em ler. O fato é que sigo trabalhando muito. E agora o inverno chegou e já estou meio doente. A ver.

Post chapa branca, ficamos com os discursos de despedida das cerimônias de formatura do Rio Branco do Ministro Celso Amorim e do Presidente Lula.


terça-feira, 2 de novembro de 2010

Drama argentino

Vejam o vídeo: os argentinos, sempre dramáticos, exagerados, apaixonados.



Lula está correto. Apesar das dificuldades, Kirchner recuperou parte do orgulho argentino. Nossos vizinhos foram massacrados por uma aliança que gostaria, se tivesse tido oportunidade, de ter feito o mesmo com o Brasil. Quando os rentistas se apropriam da agenda e do discurso político, em contexto de liberdade nos movimentos de capitais, câmbio fixo e déficit externo, a tragédia está dada. Foi o que aconteceu na Argentina. Foi desse ponto que Kirchner trabalhou para recuperar parte da auto-estima de seu povo. Justa homenagem.

Nocaute técnico

No vídeo abaixo, a então Ministra Dilma, com amplo conhecimento, e mantendo a calma, desmonta a pseudo-jornalista Miriam Leitão, uma porta-voz de baixa qualificação dos mercados financeiros. Nocaute técnico, a infeliz foi derrubada várias vezes. Parênteses: Miriam está tão atrasada que até do Serra tomou paulada. A garotinha de recados dos money managers deve se ressentir do tempo em que tinha acesso à alta cúpula econômica do governo, quando acreditava piamente, até o fim, que 1 real valia 1 dólar.

Essa foi outra entrevista na qual Dilma foi mostrando a que veio. Ela sempre se saiu melhor assim, quando é mais espontânea, livre da marquetagem.

quarta-feira, 6 de outubro de 2010

Comparações perigosas

Outro dia li num artigo interessante, que não me lembro, que o leste asiático atual lembra, de alguma forma, a Europa antes da I Guerra Mundial. Já havia escrito sobre isso e fiquei satisfeito em ver a comparação feita por alguém mais renomado (mas não me lembro quem).

Nos últimos dias, a respeito da bagunça atual no sistema monetário internacional, têm crescido as comparações com o período entre-guerras da década de 1930. Também já havia escrito sobre isso, embora pense que a comparação é válida a título de ilustração, pois hoje as coisas estão bem diferentes.

Isso vale para o leste asiático e para o sistema monetário. No 1o caso, creio que a situação política ainda não é tão delicada, embora o armamento hoje seja infinitamente mais destrutivo. O fato positivo é que os nacionalismos não são tão radicais quanto no passado, há uma integração cultural mais forte, pontes, contatos diversos. No 2o caso, talvez o contexto nos dias que correm seja pior, embora também haja algum chão antes da coisa degringolar de vez. E, vale ressaltar, o "armamento" financeiro hoje é também muito mais destrutivo: enorme liquidez, fluxos de capitais descontrolados sem vínculo com o sistema produtivo, sistemas informatizados, alta alavancagem generalizada, competição entre polos monetários regionais com modelos político-sociais e estruturas produtivas mais fragmentadas.

O texto está uma confusão ambiciosa, eu sei, tentarei elaborar mais pra frente. Porém, fica o enésimo alerta: o cenário internacional se deteriora, não há dúvida disso. Vivemos em um mundo que apresenta contornos bastante perigosos.

sábado, 25 de setembro de 2010

terça-feira, 20 de julho de 2010

Desânimo

Recentemente, após a suposta pressão inflacionária que fazia com que o mercado clamasse por nova elevação dos juros, pressão bem sucedida, ora pois, começaram a sair análises, na maior cara-de-pau, dizendo que as perspectivas de aumento da inflação eram baixas. Os números não mentem, diariamente temos novas indicações de que não há problema inflacionário, está tudo tranqüilo. Mesmo assim, os gênio$ ainda clamam por mais elevações. E possivelmente vão levar, é inacreditável.

Sabe-se bem qual é a desse jogo. Teatrinho mal montado mas eficiente que busca a captura de recursos públicos por uma pequena minoria. Isso se repete faz longos anos sob os olhares de todos. Os candidatos, com medo do mercado financeiro, necessitando arrecadar recursos para as campanhas, apenas insinuam mudanças, ou as dissimulam.

Segundo matéria do Estadão de ontem, entraram desde janeiro US$ 12 bilhões de capital externo apenas na renda fixa. Apenas na renda fixa. Juros. O juro em todo o mundo está próximo de zero. Aqui, os nacionais levam por baixo uns 4% reais, gringos tiram o dobro, sem mencionar eventual valorização do câmbio, para desespero das contas externas, que preocupam cada vez mais. Caso o governo não tivesse colocado o IOF, a farra seria muito maior. Isso bate no orçamento, bate na dívida pública, é um teatro, repito, tenebroso.

Abaixo sugiro a leitura de alguns textos. Por que? Ora, porque se relacionam com essa dura lenga-lenga mercado-Banco Central de diversas maneiras. Ideologia, interesses. A supremacia de determinada forma de pensamento, supostamente técnica, presumivelmente neutra, ancorada no bom senso científico dos modelos e certezas neoclássicas.

Todo nosso modelo político e econômico, meus caros, não nos iludamos, baseia-se em premissas filosóficas. E as premissas que vêm sendo utilizadas no gerenciamento do sistema financeiro nacional, e mundial, em boa medida, atendem a interesses muito particulares dos estratos rentistas dos diferentes países.

Eu tenho preguiça, me cansa escrever sobre isso. Já foram uns duzentos posts. Lula não teve coragem de enfrentar esse jogo. Obama sofreu para aprovar uma reforma meia boca, ainda que positiva. Espero, sinceramente, que Dilma, Serra ou Marina ponham limites na esbórnia. É dinheiro público, uma catástrofe, dá desânimo seguir escrevendo sobre esse assunto, peço até desculpas a meus poucos e fiéis seguidores.

Leiam os textos a seguir de dois digníssimos lorde inglêses, se tiverem interesse. Skidelsky é autor de famosa biografia de Keynes. Turner é o chefe do órgão regulador britânico, o mesmo já citado aqui lá atrás, quando ousar mencionar a possibilidade de taxação dos fluxos internacionais, levando às reações já esperadas da City londrina.

Coisa fina. A crítica à economia política dos barões das finanças globais.

quinta-feira, 10 de junho de 2010

Crescimento, Desenvolvimento e a torcida contrária

A propósito do post abaixo, Disco Velho, mais um texto do Embaixador Samuel Pinheiro Guimarães, que parece estar mais à vontade no debate como Ministro da Secretaria de Assuntos Estratégicos.

Transcrevo o último parágrafo. Noto apenas que o Embaixador não elabora sobre as bases socioambientais em que se daria a meta de crescimento a 7% ao ano que estipula. É a velha estória da diferença entre crescimento e desenvolvimento. Mas o texto é essencialmente correto no diagnóstico e na crítica que faz a um pensamento que busca constantemente desmerecer o país, jogá-lo para baixo, pintá-lo como um incapaz.

"Porém, finalmente e por outro lado, caso se deseje manter o Brasil como país pobre e subdesenvolvido, basta crescer a taxas modestas, obedecendo a todas as metas e a supostos potenciais máximos de crescimento, e, assim, lograr manter a economia estável porém miserável. Este baixo crescimento corresponderá a um custo humano e social elevadíssimo para a imensa maioria da população, exceto para os super-ricos, que se transformarão, cada vez mais, em proprietários rentistas e absenteístas, distantes e alheios aos conflitos que se agravarão cada vez mais na sociedade brasileira."

Disco Velho

Disco velho, notícia antiga, curioso papo que se repete de uma maneira que nem dá mais vontade de comentar. Aliás, tenho falado pouco de economia política, nacional e internacional. Num outro post comentarei sobre as pressões que agora recaem sobre o governo norte-americano para fazer o aperto fiscal. Por ora, vamos ficar com os sábios do Banco Central do Brasil que subiram novamente os juros.

Saíram números muito significativos sobre o PIB brasileiro no 1o trimestre de 2010. Era esperado. A base de comparação é fraca. E a economia retomou mesmo o ritmo de antes da crise. Com expectativas de mais crescimento, há muito otimismo. Mas os números do 1o trimestre impressionam. Ritmo chinês, cantam as manchetes. E daí seguem os ditos analistas afirmando que é algo insustentável. Há riscos de inflação, alertam. Falta poupança, argumentam. Está aberto o caminho para os gênios justificarem a alta nos juros. A maior taxa real do mundo?

Não vou entrar nas tecnicalidades. Só digo que nosso problema está na conta corrente. Que o investimento gera crescimento e dá condições para o aumento da poupança. Que a posição do câmbio também influencia a formação de poupança. Que o câmbio flutante flutua, é lógico, mas a riquza financeira dos mercados em muito supera o valor da produção global. E são movimentos em geral meramente especulativos, sem relação com emprego, renda, investimento, etc... Portanto, o câmbio flutua, mas não necessariamente devido a fatores reais. E isso distorce o ajuste da conta corrente via câmbio. Hoje li um número assustador, a projeção de déficit na conta corrente de 6% do PIB para 2011. Pagaremos o preço? Há o pré-sal. Mas não devíamos estar contando com isso assim.

Não vou e não quero me alongar. Há uma série de falácias supostamente técnicas que tentam justificar um jogo que é essencialmente político. Dinheiro fácil nos círculos da alta finança. Transferências de renda, acúmulo de riqueza. O rentismo, a hegemonia dos credores da dívida pública, a dobradinha câmbio-juros. Para colocar uma cereja no bolo, o país contribuindo para o crescimento dos países ricos via importações. Tudo que pedem à China, à Alemanha, ao Japão, sem que eles atendam, o Brasil faz por livre e espontânea vontade. Um bom menino. Para deleite dos mercados.

Quando Serra ousou questionar de maneira mais firme uma porta-voz dos credores travestida de jornalista, foi atacado. Curiosamente, Dilma declarou ser favorável a avanços na autonomia do Banco Central. O debate eleitoral é coisa de maluco, não procuremos lógica nem muita profundidade. O mesmo vale para o teatro do aumento dos juros. É tudo política, tudo muito rasteiro. Preocupo-me com o futuro.

terça-feira, 25 de maio de 2010

Geithner, Hillary e Bernanke em Pequim

2a rodada do Diálogo Econômico e Estratégico China-Estados Unidos em Pequim. High Politics. No comments allowed.

segunda-feira, 24 de maio de 2010

Relatividade social

Jessé Souza já foi citado nesse blog. Tenho alguns livros dele. É um bom analista, um desses caras que sai do lugar comum, não fica nos clichês. Quem lê a chamada, pode ficar com a impressão de que ele critica o Bolsa Família. Mas não é verdade. Cito parte de sua resposta: "O programa Bolsa Família tem extraordinário impacto social, econômico e político, com investimento público relativamente muito baixo. É incrível que não se tenha pensado nisso antes. Mais incrível ainda que exista gente contra." Porém, como ele salienta, o programa é limitado em termos mais estruturais. Mas reitero: é incrível que haja gente contrária. Entre os bem nascidos, especialmente. É inacreditável. E vamos à mini-entrevista...

Para sociólogo, Brasil ainda vive um abismo social
Jessé Souza afirma que Bolsa Família não consegue incluir mais pobres e resolver questão da desigualdade

Especialista é autor de "A Ralé Brasileira", em que estuda parcela da população que vive como "subgente"

UIRÁ MACHADO
DE SÃO PAULO

Na contramão dos estudos que apontam melhora da distribuição de renda no Brasil, o sociólogo Jessé Souza afirma que o país ainda vive uma "desigualdade abissal" em sua sociedade.
Coordenador do Centro de Pesquisa sobre Desigualdade Social da Universidade Federal de Juiz de Fora, Souza lançou recentemente o livro "A Ralé Brasileira", em que estuda as características dessa "parcela da população que vive como subgente".
A seguir, trechos da entrevista concedida por Souza.

Folha - A proporção de brasileiros vivendo abaixo da linha da miséria caiu nos últimos anos. Em seu último livro, o sr. diz ser falsa a tese de que a desigualdade brasileira está desaparecendo. Por quê?

Jessé Souza - Esses índices mostram apenas que a pobreza absoluta diminuiu. Mas a desigualdade é um conceito relacional.
O Brasil é uma das sociedades complexas mais desiguais do planeta. Entre 30% e 40% de sua população tem inserção precária no mercado e na esfera pública.
Somos uma sociedade altamente conservadora, que aceita conviver com parcela significativa da população vivendo como "subgente".
Essa classe social, que chamamos provocativamente de "ralé", é a mão de obra barata para as classes média e alta que podem -contando com o exército de empregadas, motoboys, porteiros, carregadores, babás e prostitutas- se dedicar às ocupações rentáveis e com alto retorno em prestígio.
É isso que chamo de "desigualdade abissal" como nosso problema central.

Qual sua avaliação sobre o Bolsa Família?

O programa Bolsa Família tem extraordinário impacto social, econômico e político, com investimento público relativamente muito baixo. É incrível que não se tenha pensado nisso antes. Mais incrível ainda que exista gente contra.
Por outro lado, o Bolsa Família não tem condições, sozinho, de reverter o quadro de desigualdade e "incluir" e "redimir" a "ralé".
Esse é um desafio de toda a sociedade, e não apenas do Estado. É claro que houve avanços nas duas últimas décadas, mas mudança social é muito mais do que condições econômicas favoráveis.

O senhor tem argumentado que não é possível limitar a discussão de classe à questão da renda e que é necessária uma nova compreensão das classes sociais.

A redução das classes sociais ao seu substrato econômico implica perceber apenas os aspectos materiais, como dinheiro, e "esquecer" a transmissão de valores imateriais, como as formas de agir no mundo.
E são esses valores imateriais que constituem os indivíduos como indivíduos de classe, com comportamentos típicos incutidos desde a mais tenra infância.
Como regra, as virtudes são todas do "espírito", como a inteligência. Os vícios são ligados ao "corpo". As classes superiores "incorporam" as virtudes espirituais, e as inferiores, as virtudes ambíguas do corpo.
As virtudes do espírito recebem bons salários, prestígio e reconhecimento social. As classes do "corpo" tendem a ser animalizadas, podendo ser usadas e até mortas por policiais sem que ninguém se comova com isso.

E o senhor afirma que mesmo a educação é insuficiente?

É claro que a educação é um fator fundamental. O problema é que a competição social não começa na escola.
Sem considerar que crianças de classes diversas já chegam à escola como vencedoras ou perdedoras, o que teremos é uma escola que só vai oficializar o engodo do mérito caído do céu de uns e legitimar, com a autoridade do Estado e a anuência da sociedade, o estigma de outros.

sexta-feira, 21 de maio de 2010

Abre Aspas

Pro Alon, em seu blog hoje. O mundo não é branco nem preto. Tá tudo tão cinza, tão complicado.

"Orfandade

A pátria operacional do liberalismo, os Estados Unidos, está na bica de aprovar uma revolução no sistema financeiro, aumentando drasticamente a regulação e os controles sobre ele. Isso depois de Barack Obama passar no Congresso uma também revolucionária reforma na Saúde, para incluir os excluídos da cobertura estatal.

O primeiro presidente negro dos Estados Unidos avança em sua agenda progressista, em todas as frentes. Na teoria, deveria estar sendo saudado pela esquerda latino-americana, incluída a brasileira. Mas a turma anda amuada porque Obama não lhes deu colher de chá em Honduras e agora aperta o cerco ao Irã.

O limite de Obama é o interesse nacional americano. Diferente do que alguns possam ter imaginado, ele não se elegeu para organizar a retirada, mas para continuar a hegemonia. Que hoje exige novos parâmetros.

Tem algo de humorístico a esquerda tupiniquim, Luiz Inácio Lula da Silva à frente, precisar falar mal do presidente americano bem no momento em que ele enfrenta interesses e grupos de pressão que aqui dentro o governo do PT nem pensa em criticar.

É dura a vida."

Lições chinesas

Almocei nesta semana com colegas da Embaixada e um sujeito muito interessante, Arthur Kroeber. É o editor-chefe do Dragonomics, um centro de pesquisas econômicas e também um pouco sociais e políticas a respeito da China. A formação original dele é teologia. Inteligentíssimo, bem articulado, raciocínio lógico, embora às vezes um pouco mais complexo.

Falou-se sobre muita coisa, discutiu-se, exploraram-se idéias, perspectivas, foram repassados fatos e dados recentes e outros nem tanto. Ao final, saiu a sensação de que tive duas horas realmente proveitosas.

O melhor foi dito no começo. Logo ao iniciar sua exposição sobre como via as transformações econômicas, sociais e políticas que a China vem implementando, em particular aquelas que ela necessita para manter o ritmo de desenvolvimento e certa coesão social, nosso amigo Artur veio com a seguinte pérola:

"In the short term, I mean, in the next 5 or 10 years, ...."

Fantástico. Essa é a lição número 1 em termos de China. O tempo é dilatado. E assim deve ser observada também a política internacional. Por isso, quando me perguntam sobre o Irã ou Honduras, ou outra manchetezinha de jornal, ou alguma análise de alguns bem nascidos que estão ouriçados com o upgrade recente de nosso país, eu costumo não falar muito, não me comprometo, não compro briga.

Não sabem nada. Não entendem. Dá trabalho, e requer inteligência, raciocinar como nosso amigo Kroeber. No curto prazo, quer dizer, os próximos 5 ou 10 anos. O tempo é dilatado. Não cabe na moldura da edição do jornal ou do calendário eleitoral.