sexta-feira, 23 de outubro de 2009

Big Banks Fail

Volto ao pessoal do Baseline. Recentemente, Greenspan, Volcker e Mervyn King (Governor do Bank of England) clamaram pela quebra dos grandes bancos em instituições menores. O G20 não tocou nesse tema. O Governo Obama nem ousa mexer nisso. Aos interessados, mais aqui.

O detalhe é que no Brasil, como já comentei em outro post, a concentração no mercado financeiro aumentou enormemente nos últimos 15 anos. Felizmente, a regulação aqui é muito mais abrangente e os bancos são mais conservadores. Além disso, fica fácil ganhar com os níveis dos spreads e a baixa concorrência, a dobradinha juros-câmbio, a volatilidade cambial e o crescimento da economia brasileira e do mercado de capitais. Portanto, não tiveram a necessidade de imitar algumas esquisitices imprudentes de seus pares do norte. Isso não impede, entretanto, que os argumentos sobre a influência política de instituições tão grandes sobre o Estado e a sociedade sejam válidos como o são nos EUA. Basta ver como a imprensa em peso e parte razoável do sistema político manifestaram uma irritação desproporcional com uma medida simples, marginal, contornável, comum no mundo inteiro e quase praxe nas décadas anteriores como é a imposição de 2% de IOF sobre aplicações de estrangeiros na bolsa e na renda fixa.

Sobre o IOF

Ainda estou pegando ritmo novamente no trabalho, na vida, no caminhar, se é que me entendem. A imposição do IOF tem gerado grande celeuma, como esperado. É uma medida que vai no sentido correto, embora evidentemente limitada. Limitada por várias razões, mas é o que a Fazenda podia fazer. É um sinal, mais do que algo definitivo.

A chiadeira é generalizada e oferece lições muito claras de economia política. Quem ganha, quem perde. Curiosamente, o Financial Times já se adiantou e elogiou a medida. Outros periódicos estrangeiros também. Por aqui, bem, vocês já imaginam... Vou tentar fazer um post de grande fôlego sobre o tema. Mais para frente.

Só acho engraçado que jornais do peso de uma Folha de São Paulo e um Globo coloquem em destaque que a medida fez a empresa A ou B perder x bilhões. Isso é uma bela de uma desonestidade intelectual, mostra o nível da cobertura em ritmo pré-eleitoral. Hoje me juraram que o Estadão em editorial elogiou a medida. Eu duvidei e sigo duvidando. Reitero: prato cheio para a economia política do Brasil neste final de 2009.

Enfim, quero muito sentar, respirar e escrever algo mais longo sobre o tema.

segunda-feira, 19 de outubro de 2009

O retorno do mestre

Hehehe, o mestre não sou eu. É Keynes, na pena de Skidelsky, comentado pelo Belluzzo, que hoje deve estar triste com mais uma derrota do Palestra, que sucumbiu ao Petkovic, que é sérvio mas ama o Rio, que ganhou a disputa em Copenhagen, que sediará ao final do ano a Conferência sobre mudanças climáticas, que dizem ameaça a todos nós especialmente certas ilhas como as Maldivas, cujo Presidente assinou uns documentos hoje debaixo do mar, que estava azul e límpido como em Noronha, que me lembra como gosto de mergulhar, que me leva ao eterno ponto de partida e de chegada das últimas semanas, que é o fato de eu estar novamente com perna detonada me sentido um incapaz, fraco, sob constante risco de ter um piripaque coagular, que seria uma tragédia, um saco, fato absolutamente lamentável.

Enfim, esse blog não é para ser algo pessoal, mas no momento é inevitável comentar, fiquei sem disposição para postar, escrever, depois do baque sanguíneo vem o baque físico e depois o psicológico, estou melhorando mas não é fácil, tudo muito lento.

Tantas coisas interessantes para comentar:

a) As Olimpíadas, a marolinha, o pré-sal, o G-20 e certo ufanismo com o Brasil. O caderno Mais da FSP e diversos outros artigos têm discutido essa questão. O interessante é que a esquerda sempre combateu o ufanismo, considerado meio para as elites reforçarem seu controle sobre as massas, etc..., aí dá uma longa e fantástica digressão. O governo é mesmo de esquerda? Está errado ser otimista? Isso é ignorar nossas dificuldades? O otimismo da esquerda é decorrente da aprovação nacional e internacional do Lula, do bom momento do Brasil, da desmoralização das teses privatistas, da crescente autonomia brasileira (energética, alimentar, financeira, etc...), da presença mais forte da política externa, da redução da pobreza e das desigualdades?

b) Obama conseguiu algumas vitórias preliminares no Congresso, mas a coisa ainda está tímida. Ele está enfrentando dificuldades excepcionais. Seu governo declarou guerra à Fox News. As relações entre a mídia e o poder têm evoluído (involuído?) em diversos países. Lula e a Veja/Globo/Estadão/FSP. Os Kirchner e a mídia na argentina. Berlusconi. Dá um post gigantesco, um livro, um compêndio. A mídia deixando de ser um quarto poder, fiscalizador, vigilante, para se tornar quase um partido político, curiosamente atuando contra a própria política, enfim, seriam devaneios ótimos para se elaborar.

c) O Brasil vai colocar alguma areia na engrenagem do carry trade, nos capitais que ameaçam nos afogar? Como, quando, onde, de que forma? Como estou atualizando/corrigindo/reescrevendo o post, vi agora no uol que saiu a medida de taxação de 2% do capital estrangeiro em bolsa e renda fixa. A chiadeira do mercado será enorme.

d) Teremos COPOM na próxima semana. O juro deve ser mantido. A pressão de alguns setores espertalhões do mercado financeiro foi arrefecida. Prevalece, por enquanto, certo bom senso.

e) As eleições em 2010. A oposição patina, o governo acelera.

f) A política externa brasileira definitivamente está se tornando tema de política interna. Os debates na ONU, sobre clima e direitos humanos especialmente, estão por aí. As questões na América Latina. Infelizmente, a cobertura tem sido pautada pela parcela neocon de nossa imprensa. Há muita desinformação. O Presidente do Irã vem aí, aguardemos. Em Honduras, felizmente, os caras lá devem chegar a algum acordo em breve.

g) A seleção sub-20 vacilou na final, mas acompanhei os jogos e vi que temos uma bela safra para 2014. A seleção principal mostrou que sente a falta do cracaço Robinho.

h) Ontem, inspirado pelo post sobre Glauber-Di, revi o filme sobre nosso gênio do cinema novo. De Silvio Tendler, um filmaço sobre uma grande figura.

i) A questão da Vale, poxa, eu poderia fazer um post sobre isso. A Vale não pode ser tratada como uma empresa privada qualquer. Por várias razões. Duas principais: o governo detém enorme participação acionária e a financia via BNDES; ela extrai minérios do sub-solo, que constitucionalmente são da União, ou seja, a Vale é uma concessão. Um dia escrevo sobre isso.

j) A economia global: segue em pasmaceira, apesar do otimismo dos mercados. É preciso regular as finanças, elas continuam sem controle. Estamos nos arriscando com novas bolhas, sucessivos descolamentos entre a esfera financeira e o lado produtivo, o emprego e a renda do trabalho.

Mais um textinho do Belluzzo, com algum destaque em negrito para coisas que já comentei aqui.

LUIZ GONZAGA BELLUZZO

O retorno do mestre


DIZEM POR aí que Keynes voltou à moda. Autor de três volumes sobre a vida e obra do célebre economista, Robert Skidelsky entregou à praça recentemente o livro "The Return of the Master". Digo ao leitor que o livro, um ensaio, nos apresenta um Keynes mais revolucionário e inovador do que revelado na alentada biografia. Nos três magníficos volumes da biografia, Skidelsky cuidou de demonstrar que a crítica de Keynes ao capitalismo liberal era menos radical do que parece.
A responsabilidade pela transfiguração do economista-defunto nas mãos de seu biógrafo mais badalado cabe à derrocada intelectual da teoria econômica dominante nas última quatro décadas. Os "economistas clássicos" criticados por Keynes em tantas ocasiões eram tão razoáveis quanto modestos se comparados aos desatinos "científicos" das últimas quatro décadas. A escola Nova Clássica, por exemplo, levou ao paroxismo, para não dizer ao ridículo, as hipóteses construídas a partir do comportamento racional e da tendência ao reequilíbrio "espontâneo" dos mercados. Na concepção dos novos economistas, a sociedade é formada por indivíduos racionais e maximizadores, partículas obcecadas pelo cálculo utilitarista, que jamais alteram seu comportamento na interação com outras partículas carregadas de racionalidade. Skidelsky vai fundo ao argumentar que os economistas definem o comportamento racional como aquele consistente com seus próprios modelos. Todas as outras formas de comportamento são tratadas como irracionais, configurando um enorme projeto ideológico incumbido de redefinir os humanos como pessoas que acreditam nas coisas que os economistas pensam sobre eles.
Keynes construiu uma teoria das decisões privadas em condições de incerteza. Alegava que não é possível a avaliação inequívoca dos resultados mais vantajosos mediante o cálculo de probabilidade. As pessoas, diz o economista Athol Fitzggibons, agem movidas pelo autointeresse inteligente, mas apoiadas no conhecimento não quantificável; as teorias do comportamento racional pressupõem que os agentes são movidos pelo autointeresse e pelo conhecimento quantificável. Eles fazem escolhas inteligentes entre vários futuros possíveis, o que permite à teoria das expectativas racionais concluir que eles podem convergir para apenas um futuro possível.
Na vida real dos mercados, os empresários tangidos pelo otimismo quanto aos resultados dos novos empreendimentos atropelam o medo do futuro incognoscível e decidem produzir nova riqueza. Mas o sucesso não aplaca, senão excita o desejo, suscitando a febre de investimentos, o crédito imprudente e bolhas especulativas.
Por isso, Keynes insistia "na direção inteligente pela sociedade dos mecanismos profundos que movem os negócios privados". A instabilidade inerente à economia monetária da produção só pode ser amenizada mediante a ação jurídica e política do Estado e pela atuação de "corpos coletivos intermediários", como um Banco Central dedicado à gestão consciente e socialmente responsável da moeda e do crédito.

domingo, 11 de outubro de 2009

Di Glauber Cavalcanti - Parte II

Continuação da poesia de imagens, versos e sons. História da Arte, fantasticamente envolventemente hiperbolicalização de sentimentos de admiração e bem querer.

Cliquem aqui para um breve passeio sobre a vida e a obra de nosso amigo Di.

Gênios da Raça

Glauber gênio da raça em seu quase mítico documentário realizado após a morte do amigo parceiro irmão Di Cavalcanti.

Ninguém assistirá ao formidável enterro da tua última quimera, somente a ingratidão, aquela pantera, foi a tua companheira inseparável.

Trilha sonora, música, amizade e paixão, imagens, ação, imaginação, poesia, alegria, brincadeira, homenagem, colagem, sentimento, movimento, cortes, profundos, difusos, abertos, incontroláveis, Glauber gênio da raça, Di imortal, Brasil século XXI.

sábado, 10 de outubro de 2009

Chico Ciência e Zumbi Nation

Sequência de visionários no blog

Estamira e os Espertos ao Contrário

Os inumeráveis estados do ser.

Obama Prêmio Nobel

Mensagem de congratulação do Presidente Lula ao Presidente Barack Obama, pelo recebimento do Prêmio Nobel da Paz

“A Sua Excelência o Senhor
Barack Obama
Presidente dos Estados Unidos da América

É com grande alegria que felicito Vossa Excelência pelo recebimento do Prêmio Nobel da Paz deste ano.

Ao agir com a “profunda urgência do agora” a que se referia Martin Luther King em sua luta pelos direitos civis, Vossa Excelência iniciou, em apenas nove meses de mandato, esforços diplomáticos que têm o potencial de criar um ambiente internacional marcado pela paz e pelo desenvolvimento justo e sustentável.

Sou testemunha de seu compromisso genuíno em construir pontes e superar desconfianças. Estou certo de que o Prêmio ora atribuído a Vossa Excelência o encorajará a perseguir, com ainda maior afinco, a revalorização do multilateralismo, a ênfase no diálogo e no consenso, a busca de um mundo sem armas nucleares, os esforços pela paz no Oriente Médio e o estabelecimento de um modelo econômico sustentável.

Vossa Excelência pode estar certo de contar com o Brasil para a consolidação desse legado para as próximas gerações.

Luiz Inácio Lula da Silva

Presidente da República Federativa do Brasil”

Estamira

Documentário premiadíssimo entre a arte, a loucura e a política.

sexta-feira, 9 de outubro de 2009

Ausência

Crise, notícias da crise, cansaço, coágulos, veias entupidas, a ausência não foi proposital muito menos era desejada.

Ontem fui ler o Valor e estava na capa que a alta de 0,25% nos juros australianos havia sido um dos motivos para o boom dos mercados da véspera. Não há lógica, não há sentido, não há razão. Estamos adentrando perigosamente o terreno de novas bolhas. O Brasil está quicando, é uma cereja deliciosa, temos que tomar muito cuidado.

Os movimentos regulatórios que efetivamente se concretizaram até agora foram muito tímidos. As finanças estão novamente enlouquecidas... os amigos de Geithner (aqui, aqui e aqui) e seus seguidores nos EUA, na Europa e na periferia deslumbrada são muito perigosos e avançam dopados pelas garantias dos governos, pelos juros lá embaixo, pela idéia tola e quase calhorda de que tudo já passou.

Crise, notícias da crise, coágulos, veias entupidas. Estou cansado disso.

sábado, 3 de outubro de 2009

Terrorismo

Nelson Barbosa, Secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda, esculachou ontem aqueles que fazem terrorismo com os dados fiscais do Brasil.

Como eu já disse aqui, alguns "analistas" e papagaios por aí ignoram números, dados históricos, perspectivas e comparações internacionais e assim buscam chantagear o país para que haja uma alta nos juros e corte nos gastos e investimentos do governo. Fingem ignorar, ainda, que o país está tentando superar algo que nos países ricos significou a mais grave crise desde a Grande Depressão.

Nelson Barbosa falou tudo. Com terrorista não se negocia.

sexta-feira, 2 de outubro de 2009

O ensino de economia II

Agora, o outro lado. Leda Paulani, autora do magnífico "Modernidade e Discurso Econômico". E Belluzzo, grande mestre, talvez o maior economista brasileiro da atualidade. Um diplomata das idéias, fico admirado quando o vejo questionar com ar meditativo os maiores absurdos de nossos noveaux économistes.

1. Sociedade, instituições e história
LEDA PAULANI

Recentemente, a rainha da Inglaterra visitou a lendária London School of Economics e perguntou aos doutos docentes por que ninguém lograra prever a profundidade da crise que se avizinhava. Os professores, cultores da teoria ortodoxa, crédulos do mercado e de suas divertidas utopias (autorregulação, eficiência, ótimo social), responderam que, contando embora com as mais brilhantes mentes matemáticas, o cálculo do risco enfocara apenas fatias do mercado. O sistema como um todo não fora considerado.
O que eles não disseram é que, formados na doxa econômica, os economistas jamais conseguiriam fazer esse tipo de análise totalizadora.
A formação hoje dominante põe ênfase apenas na matemática, nas técnicas de modelagem, olhando com enfado quaisquer considerações não passíveis de matematização.
Sociedade, instituições, história não cabem nessa visão, são anticientíficas.
A filosofia também não tem lugar, pois é com fastio igual que se encaram as questões metodológicas.
Economistas heterodoxos se deram conta dessa lacuna na resposta desses professores e lembraram a acusação, feita em 1991, por uma comissão da Associação Americana de Economia, sobre os cursos de pós-graduação em economia, os quais estariam formando "sábios idiotas", treinados na técnica, mas "inocentes" do mundo real.
A crise, porém, não estancará a produção de sabichões. Uma formação que desdenha a mais abrangente e consistente teoria do capital só pode continuar a fazer o que tem feito: vender ideologia como ciência.
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LEDA PAULANI é professora titular da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da USP e autora de "Brasil Delivery" (ed. Boitempo).

4. Repor a razão na história
LUIZ GONZAGA BELLUZZO

Ao longo do século 19, a economia abandonou definitivamente os constrangimentos da política e inventou o Homo oeconomicus.
Dotado de conhecimento perfeito, esse ser, produto da mais absurda abstração, busca maximizar sua utilidade ou os seus ganhos, diante das restrições de recursos que lhe são impostas pela natureza ou pelo estado da técnica.
Os sistemas sociais nascidos desse paradigma dominante em economia não dispõem de uma estrutura intrínseca, isto é, esgotam-se nas propriedades atribuídas aos indivíduos racionais e maximizadores, partículas que definem a natureza da ação utilitarista e que jamais alteram seu comportamento na interação com as outras partículas carregadas de "racionalidade".
Os manuais de economia mais badalados acatam as chamadas teorias novo-clássicas, com expectativas racionais.
Elas afirmam que a estrutura do sistema econômico no futuro já está determinada agora. Isso porque a função de probabilidades que governou a economia no passado tem a mesma distribuição que a governa no presente e a governará no futuro. A historicidade da vida social vaza pelo ralo.
Para os que dissentem dessa visão, a economia é um saber que está obrigado a formular suas hipóteses levando em consideração o tempo histórico, dimensão em que se desen- rola a ação humana.
Ela deve se entregar ao estudo do comportamento dos agentes privados em busca da riqueza, no marco de instituições sociais e políticas construídas pelas ações e decisões coletivas do passado, ou seja, pela história.
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LUIZ GONZAGA BELLUZZO é economista e professor aposentado da Unicamp. É autor de "Ensaios Sobre o Capitalismo no Século 20" (ed. Unesp).

O ensino de economia I

Como havia comentado num post anterior, o Caderno Mais da FSP do dia 13 de setembro, creio, fez uma discussão, na esteira de um ano após a quebra do Lehman, sobre o ensino de economia. A pergunta era: "Há alternativas, novos temas ou enfoques que devam ser incorporados ao ensino de economia?" Foram quatro respostas.

As duas selecionadas abaixo vão no sentido da economia como ciência: modelos probabilísticos, fórmulas, metodologias estatísticas. A economia fechada sobre si mesma. O individualismo, o homo economicus, suas preferências, a racionalidade, a utilidade marginal. Quem lê este blog sabe minha opinião. Eu vejo valor nesses caras, mas a título de curiosidade. Quando buscam aplicar suas teses às políticas públicas, é preciso derrubá-los em suas premissas. Puxar o tapete de todo o edifício ideológico. Questionar a preeminência do indivíduo. Sua suposta racionalidade. A generalização de princípios abstratos. A aparente despolitização das teses. Seu a-historicismo.

Bom, sacanagem né, fiquei de colocar os textos e já saio esculachando. Acho que tenho dificuldade de ser neutro. A neutralidade é um saco. Algo muito pretensioso, está acima de minhas possibilidades. Gosto de ter lado, tomar partido. Talvez, quando ficar mais velho, quem sabe...


2. Ajuste fino dos modelos
VINICIUS CARRASCO

O papel de um economista é avaliar o desempenho de instituições econômicas (por exemplo, mercados, organizações e outros) em mediar a interação de agentes.
Portanto, a suposição feita de que os agentes econômicos são autointeressados e racionais (tomam as melhores decisões para eles) é indispensável:
caso não a fizéssemos, não conseguiríamos identificar se uma determinada ineficiência econômica advém de instituições mal desenhadas ou de ações tomadas por agentes imperfeitos.
Não quero, de maneira nenhuma, subestimar a imperfeição humana. Só acredito que ela não deva ser objeto de análise de economistas (talvez o seja de psicólogos e psi- quiatras).
Usando a crise atual como exemplo, ao supor racionalidade por parte dos agentes, os economistas conseguem identificar de maneira limpa, entre outras, as falhas que houve nos desenhos da regulação financeira e de incentivos dos tomadores de decisão e, com isso, propor mudanças.
Segue daí que não sou entusiasta das abordagens comportamentais e psicológicas à economia, muito em voga em alguns centros nos EUA. Em particular, acredito que, antes de sua incorporação ao currículo de economia, é necessário que incorporemos, tanto aos currículos quanto às agendas de pesquisa, aspectos não psicológicos extremamente relevantes, mas que nossos modelos, especialmente os macroeconômicos e de finanças, ignoram em geral: heterogeneidade, dispersão (e assimetria e imperfeição) de informação entre agentes e falhas de mercado, entre outros.
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VINICIUS CARRASCO é coordenador de graduação do departamento de economia da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro.

3. Aumentar o formalismo
LUIS HENRIQUE BRAIDO

O princípio básico da ciência econômica -denominado individualismo metodológico- enfatiza a liberdade de escolha do indivíduo frente às estruturas sociais. Portanto, não há como iniciar um curso de economia sem ensinar os modelos de escolha individual.
Como a relação entre indivíduos livres é intermediada por mercados ou outros mecanismos sociais, o conhecimento rigoroso sobre equilíbrio geral, teoria dos jogos, desenho de mecanismos, externalidades e assimetria de informação constitui o segundo pilar de qualquer programa na área.
Por fim, como a seleção entre teorias alternativas depende de testes empíricos, o economista moderno necessita de sólida formação quantitativa.
A separação entre temas macroeconômicos e microeconômicos está superada. A profissão dispõe de um corpo teórico consolidado para analisar temas tão diversos quanto finanças; comércio internacional; políticas monetária, fiscal, cambial e industrial; história econômica; regulação e defesa da concorrência; previdência; meio ambiente; desigualdade social; crime e educação.
A abordagem desses temas baseia-se no método científico, que enaltece a dedução lógica formal e o confronto de suas conclusões com fatos observáveis. A utilização desse método permitiu à civilização ocidental alcançar notável progresso tecnológico nos últimos séculos.
Ao dotar seus alunos desse poderoso instrumental analítico, o curso de economia capacita-os a diferentes desafios profissionais. Para tanto, cabe às instituições brasileiras elevar o formalismo no ensino de teoria econômica e ampliar o número de docentes e discentes envolvidos em pesquisas científicas de nível internacional.
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LUIS HENRIQUE BERTOLINO BRAIDO é diretor de ensino da Escola de Economia da FGV-RJ.

O jogo esquenta

O PPS parece que vai pedir a saída do Ministro Celso Amorim. A filiação dele ao PT seria incompatível com o cargo. Para além da óbvia tolice, da jogadinha para a torcida, sugiro ao partido que dê uma palavra com os republicanos. A Hillary é filiada ao Partido Democrata. Se tivermos uma imprensa minimamente competente, amanhã já teremos um quadro com os Chanceleres de diversos países e eventuais filiações. Creio que haverá inúmeras. Se o Ministro quiser ser candidato, após décadas servindo, como Chanceler e Embaixador nos principais Postos, os Governos Itamar, FHC e Lula, não vejo o menor problema. Pelo contrário, bom para o país, para uma sociedade que sempre reclama do baixo nível dos políticos. Enfim, isso é espuma.

A filiação do Meirelles é um lance que dá uma conversa mais legal. Tem a ver com um monte de coisa que já escrevi. O Gustavo Franco saiu do governo e virou administrador da riqueza dos muito muito ricos, de pessoas que fazem parte do estrato que compreende, sei lá, 0,3% da população brasileira. Tornou-se milionário após sair do governo, apesar de ter ajudado a quebrar o país (dobrou a dívida externa em 4 anos, nos deixou 6 anos na UTI do FMI). O Pérsio Arida esteve no Itaú e hoje tem seu próprio clubinho de investidores. O Malan foi para o Conselho do Unibanco, hoje está no Itaú-Unibanco. O Toros, o Mesquita e um ou outro de hoje em dia vieram e voltarão para o mercado financeiro. Assim como o Azevedo, o Professor de Deus, o Ilan, tem aquele que posava como o mais radicalzinho e que acabou indo trabalhar para o Daniel Dantas, pois bem, há uma vasta lista. Não posso deixar de comentar que o genro do FHC, antigo chefão da ANP, passou a dar consultoria a empresas estrangeiras na área petrolífera. Nada ilegal, tudo bem.

Já o Meirelles não pode sinalizar que vai voltar para a política. O mercado não gosta da política, associa eleições a riscos, o legal é ganhar dinheiro na esfera financeira negociando os títulos da dívida, arbitrando, captando a custo quase zero e aplicando com retornos por volta de 10% mais a valorização do câmbio.

Parte de nossa elite supostamente bem pensante, cosmopolita, com amigos nos grandes centros financeiros de NY, Londres, Frankfurt, Paris e Tóquio, associa a política a algo ruim. Fico por aqui, não sem reparar que na hora de financiar campanhas eles costumam ser bem participativos.

O Meirelles vai ter que pagar pedágio e bancar uma alta desnecessária nos juros. Será?

As eleições se aproximam e o jogo esquenta. Vem mais por aí. Procuro não baixar o nível. O Brasil está acima de picuinhas pessoais. Cada um faz o que quer da sua vida. O fato de vir do mercado financeiro não impede ninguém de separar as atividades e ser um administrador público isento. Da mesma forma, ser funcionário público de carreira não garante nada. E uma filiação partidária geralmente é apenas isso: uma filiação, uma carteirinha, mesmo porque os partidos atualmente não tem uma ideologia muito coerente, são geléias, circunstâncias, agrupamentos provisórios não muito ancorados em idéias e práticas.

Estou entrando em zonas muito perigosas. Não devia estar aqui falando de coisas do dia-dia, muito menos insinuando palpitar no jogo sujo que cresce conforme se aproximam as eleições. É bom mesmo que eu vá para longe, vou ler os clássicos, tirar um descanso merecido.

Retomo: o Brasil está acima de tudo isso, acima de PT x PSDB, Estado x Mercado, notinhas em jornais e posts em blogs. Vazamentos, espionagens, relações promíscuas na imprensa, etc...

Nem sei porque desci tanto a essas coisas, a Honduras também. Havia prometido falar sobre o "Na Real do Real" (nada a ver com o Plano Real), sobre a obra maravilhosa de Teresa Pires do Rio Caldeira, sobre Mariana Fix, enfim, mudar um pouco o foco para a questão do urbanismo. E fiquei só nessas pataquadas. Lamento e talvez me arrependa. Mas taí, não vou apagar não. Foda-se.

quinta-feira, 1 de outubro de 2009

Rápidas: Honduras e Agências de Risco

Parte de nossa imprensa udenista, sempre os mesmos, está quase para afirmar que torce para uma guerra civil em Honduras. Chegam pertinho. Assim poderão dizer que o Brasil insuflou e é responsável pelas mortes de um monte de gente. Outros se divertem com alguns meneios incoerentes da diplomacia norte-americana para a região. Torcem também para que os EUA retirem o apoio que até agora vêm oferecendo ao governo constitucional do Zelaya, seguindo aliás todos os outros países do mundo. Alguns articulistas mais delirantes propõem a derrubada do Ministro Celso Amorim e o impeachment do Presidente Lula. Nada mais que isso. Segundo eles, o princípio constitucional da não-intervenção não estaria sendo cumprido. Sim, sim, claro, impeachment, fantástico. Adorei ler isso. São os nossos golpistas. Há, evidentemente, uma questão muito interessante que perpassa o tema: onde termina a defesa da democracia e onde começa o intervencionismo? É uma discussão muito legal. Mas daí a propor o impeachment mostra o grau de desespero e revela os laivos golpistas que sobrevivem na nossa UDN do século XXI.

Sobre o tema das agências de risco, para não dizerem que exagero na falta de critérios delas. Comparem os números do México e do Brasil. Todos os números, se quiserem. Vejam o impacto da crise em nossos amigos hermanos do norte, que apresentam severa dependência do mercado norte-americano (como, aliás, nos recomendava parte da UDN na imprensa, que dizia que o Brasil devia focar nos países mais ricos ao invés de trabalhar pela diversificação). Vejam as previsões de crescimento do México. Saibam que o México explorou quase todo seu petróleo nos últimos anos, saiu exportando tudo, e agora está meio que sem, para se tornar importador. Já o Brasil, ehhehe. Agora leiam este trecho sobre as razões pelas quais a Fitch (uma das três agências do oligopólio) coloca o México em melhor posição que o Brasil, dois graus:

Regarding the investment credit rating gap between Mexico and Brazil, Fitch ratings stated that the possibility that Mexico will be downgraded is higher than the likelihood that Brazil will be upgraded. According to Fitch analyst Shelly Shetty “Mexico's BBB-plus rating -- two levels above Brazil's BBB-minus rating -- is supported by the country's institutional strength, including a formally independent central bank and a track record of fiscal responsibility. But Brazil has clearly held up better than Mexico" during the recent economic crisis. (Reuters, 09/29/09)

A força institucional do país: sim, claro, durante décadas o mesmo partido governou. Tiveram (ou ainda tem?) uma insurreição armada em parte do território (Chiapas, Zapateros). Estão em guerra com um narcotráfico descontrolado.

Um Banco Central formalmente independente (da política, mas não do mercado): e desde quando isso é vantagem? e desde quando o nosso BC não tem atuado com enorme independência. Po, por aqui já é dado como certo que irão subir os juros para saciar a sede de sangue dos rentistas, taí, o mercado (em sua versão mais limitada) vai ficar felizão com as próximas decisões de nosso BC "independente". Ver post abaixo sobre o tema.

Um histórico de responsabilidade fiscal: o México, que foi o primeiro a dar o default na década de 80? E o Brasil por acaso não está com as contas em ordem? E bem melhores que as do México?

Com todo o respeito ao México, um país maravilhoso com um povo que considero nossos primos. Que atua conosco em uma série de temas da política internacional. Com uma história magnífica. Com belíssimas, inteligentes e meigas mulheres, especialmente as de sobrenome Valdes. Com praias e lugares fantásticos para mergulhar. Com sol, música e futebol.

Voltando ao tema, ehehe, Viva México, poderia me alongar um pouco, mas esse post é para ser rápido: as agências de risco ficam entrando nessa seara institucional, como se houvesse um "one size fits all model", uma receita de bolo para o desenvolvimento, isso é de uma cretinice grotesca. Trata-se do ramo da "ciência econômica" que se convencionou chamar de institucionalismo neoliberal, muito forte durante a década de 90, aquela que arruinou diversos países da região. Uma tolice, meias-verdades, lugares-comuns, manuais de bom comportamento elaborados nas universidades norte-americanas e em alguns círculos de Washington para uso da periferia deslumbrada. O Brasil já jogou fora a cartilha faz tempo, felizmente. Teremos o nosso modelo. Só o modelo brasileiro serve ao Brasil.

Por isso digo e repito: as agências de risco não sabem muita coisa. Existem, são uma realidade. Mas não devemos dar muita bola para o que nos sugerem. Não têm qualquer compromisso com o desenvolvimento do país. Não foram eleitas por ninguém, não estão sujeitas a nenhuma forma de controle. Caso estivessem, todos seus funcionários já teriam perdido o emprego, pois as agências erraram vergonhosamente nos inúmeros casos de financial meltdown que tivemos nos últimos 15 anos.

Longe vai o tempo em que devíamos nos submeter às avaliações desses caras para evitarmos a perda da "confiança do investidor externo". O Brasil hoje está em outro patamar. Estamos deixando a adolescência e assumindo um lugar mais condizente no jogo das nações. Por mais que haja uma torcida influente no sentido contrário. Dentro e fora do país.

Sobre Pittsburgh

Nosso amigo PNBJr, evidentemente, confere grande peso à questão da distribuição de voz e representação no FMI. Está correto, mas eu destacaria também que é preciso avançar com passos concretos no âmbito da regulação financeira. O G20 estabeleceu guidelines, mas é preciso que se materializem. Martin Wolf, do Financial Times, Simon Johnson, do Baseline, diversos analistas e até o FMI, no recente Global Financial Stability Report, advertem para os riscos de certa complacência que poderia nos levar a uma nova crise. Mais tarde, poderei retornar com comentários sobre esse relatório do Fundo.

Por enquanto, comemoremos mais uma vitória da diplomacia financeira internacional do Brasil. Um enorme sucesso.


PAULO NOGUEIRA BATISTA JR.

G20 e FMI depois de Pittsburgh

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Em Istambul, a batalha vai continuar; o Brasil procurará consolidar os avanços obtidos em Pittsburgh
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A CÚPULA em Pittsburgh foi um momento decisivo em termos de G20 e de FMI. O Brasil, atuando em conjunto com os outros Bric, e em estreito diálogo com os Estados Unidos, obteve vitórias importantes. Posso assegurar, leitor: não deixamos passar a oportunidade a que me referi no artigo da semana passada. No meu entender, foram dois os resultados mais importantes: a) a formalização do G20 como principal instância econômica; e b) o acordo sobre a transferência de poder decisório no FMI.
A designação expressa do G20 como principal foro para a cooperação econômica internacional consagra o que já vinha ocorrendo. Formaliza-se a substituição do G7 pelo G20 em matéria econômica. Afasta-se o risco de que o papel desempenhado pelo G20 desde o final de 2008 fosse visto apenas como temporário, limitado ao período mais agudo da crise.
Afasta-se também a alternativa, preferida por países como a França e a Itália, da ampliação do G7 para G13 ou G14 -formato que seria menos conveniente para nós do que o G20.
O G20, como se sabe, tem como membros todos os países do G7 (EUA, Japão, Canadá e os quatro grandes europeus) e mais um país desenvolvido (Austrália), os Bric (Brasil, Rússia, Índia e China) e outros países de mercado emergente (Coreia do Sul, Indonésia, Turquia, Arábia Saudita, África do Sul, México e Argentina), além da União Europeia. A composição do G20 é razoavelmente equilibrada. Trata-se obviamente de agrupamento muito mais representativo do que o G7.
Outro grande resultado de Pittsburgh foi o acordo sobre a transferência de cotas no FMI. As cotas são o principal determinante do poder de voto na instituição. Ficou estabelecido que na próxima revisão geral de cotas, a ser concluída até janeiro de 2011, haverá transferência de pelo menos 5 pontos percentuais para os países dinâmicos de mercado emergente e em desenvolvimento.
Atualmente, os países desenvolvidos têm 60% das cotas e os países em desenvolvimento, 40%. A participação dos emergentes e em desenvolvimento no total das cotas aumentou apenas 5 pontos percentuais nos últimos 30 anos. Para a próxima revisão, foi fixado um piso para a transferência, 5 pontos, mas não um teto. Os Bric vão continuar lutando por uma transferência maior, da ordem de 7 pontos.
Mas, mesmo que prevaleça o piso, será a maior transferência de poder decisório da história do Fundo.
Hoje, chego a Istambul para a reunião anual do FMI, onde essa batalha vai continuar. A delegação brasileira, comandada pelo ministro da Fazenda, irá procurar consolidar os avanços obtidos em Pittsburgh e discutir os próximos passos da reforma do Fundo.
Uma palavra final sobre a atuação do Brasil em Pittsburgh. A delegação brasileira foi das mais influentes. O trabalho começou bem antes de Pittsburgh e exigiu difíceis negociações nas quais os Bric tiveram papel central. A mediação dos EUA foi crucial para vencer a resistência dos europeus, os principais interessados na preservação do status quo.
Mas posso dizer tranquilamente: a contribuição do Brasil foi fundamental. Escrevo essa frase com orgulho, e paro um pouco para pensar. Bem sei, leitor, que o brasileiro é um pobre e humilde ser, que duvida de si mesmo e da sua capacidade. É o célebre complexo de vira-lata, apontado por Nelson Rodrigues. Isso é muito verdadeiro, eu sei.
Mas, ouso dizer: o brasileiro está mudando e vai aos poucos deixando para trás suas velhas e arraigadas inseguranças.

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PAULO NOGUEIRA BATISTA JR. , 54, escreve às quintas-feiras nesta coluna. É diretor-executivo no FMI, onde representa um grupo de nove países (Brasil, Colômbia, Equador, Guiana, Haiti, Panamá, República Dominicana, Suriname e Trinidad e Tobago), mas expressa seus pontos de vista em caráter pessoal.