quarta-feira, 23 de setembro de 2009

Grau de Investimento

A Moody´s promoveu o Brasil a grau de investimento. Notícia boa, é óbvio. Não atrapalha, é evidente. Mas dá pra levar a Moody´s a sério? Por acaso há algo de científico, ou racional, ou lógico, nos obscuros critérios das agências de risco?

Sim, há um pouco de critério. Mas são bem maleáveis. Por exemplo, nosso déficit, nossa dívida pública e a dívida externa estão absolutamente sob controle. Não há o menor risco de qualquer problema. Então porque essa demora toda em promover o Brasil?

Uma rápida olhada numa hipotética tabela dos países com suas classificações de risco ao lado dos indicadores de déficit e dívida já demonstraria toda a falácia dos critérios das agências. O Brasil tem indicadores melhores do que boa parte dos países do G7, senão de todos. Nossa posição é muito mais sólida do que a de diversos países que têm o glorioso grau de investimento. Talvez uns 5 países apenas atualmente estejam em melhor situação. E qual a classificação do Reino Unido? Da Espanha? Da Grécia? Da Irlanda? Do México? Da África do Sul? Turquia? Colômbia? Comparem as classificações desses países com a do Brasil. Depois vejam os números. Acrescentem a isso as perspectivas do pré-sal, do crescimento do crédito e do mercado interno. Enfim...

Na verdade, o próprio mercado financeiro internacional opera cheio de preconceitos. Dêem uma olha na tabela da última página do Economist, que assinala os spreads dos títulos de 10 anos. O Brasil vem diminuindo o custo de captação, mas ainda há um delta injustificável. Países que atualmente estão numa situação muito chata ainda se financiam mais barato do que nós.

Mas voltando aos analistas das agências de risco, coitados, vivem dessas classificações politicamente enviesadas e às vezes arriscam recomendações por "reformas estruturais". Antes eram clamores por reformas diariamente. Parece que hoje avançamos, a coisa tá mais comedida, mais discreta. Afinal, os caras estão mais humildes, após a enormidade de asneiras que fizeram. E hoje há um entendimento geral de que não há receita de bolo para o desenvolvimento. Mas a postura de alguns desses analistas de risco continua sendo de uma cretinice total.

Bom, avanço na crítica ressaltando que as agências são remuneradas pelos emissores de títulos, não pelos investidores, por exemplo. Há um claro conflito de interesses. Não sei bem a quantas andam as propostas de regulação dessas criaturas. Vou verificar. Recordo ainda que as agências de risco formam um oligopólio, representam mais uma falha nos mercados.

Os caras erraram grotescamente diante da crise. Foram cúmplices, partícipes, atores em todo o castelo de cartas que desabou. Jogaram juntos na chantagem ao Brasil que ocorreu entre 1995 e 2004. "Façam o dever de casa ou a confiança do investidor estrangeiro desaparecerá e o país vai quebrar."

Retomo pela milésima oitava vez esse estandarte: um país como o Brasil não pode se colocar sujeito às avaliações desse tipo de gente. Dependente desse tipo de percepção. Submisso aos fluxos de capital externo, mesmo que sejam IED, para financiar seu crescimento. Por digo, repito, recomendo e reitero: não podemos brincar com a conta corrente nem com a dívida interna. Uma nação como a brasileira não pode se submeter passivamente às vontades dos credores da dívida. Pior ainda se assimilar mentalmente as demandas de nossos credores como sendo o nosso interesse. Esse é um passado trágico, e recente, que esperamos não mais retorne.

Parágrafo de uma frase só: a identidade contábil que coloca que o déficit em conta corrente representa poupança externa que complementaria nossa baixa taxa de investimentos, decorrente da baixa poupança interna, é uma falácia perigosíssima.

Enfim, volto. Acho divertidíssimos os argumentos desses pobres analistas das agências de risco. Realmente é engraçado ver a pose de seriedade, de juízes da sustentabilidade econômica, da lógica supostamente racional que os rege. E aí me recordo que os números mais básicos desmentem as classificações deles. Recordo-me que eles erraram para tudo quanto é lado. Desde a crise do México, até o leste asiático, até a Russia, a Argentina, a bolha da internet, os caras já têm um histórico de chorar. É curioso como continuam com certo ibope.

Esse post ficou meio bagunçado, talvez esculhambado. Mas o recado tá mais ou menos claro, penso. Promoveram o Brasil? Que bom. Precisamos desses caras? Não. Eles sabem do que falam? Não. Eles têm algum compromisso com o desenvolvimento da nação? Não. A quem eles respondem? Aos credores da dívida brasileira e, de maneira geral, aos centros das finanças globais. Eles têm algum poder? Infelizmente, ainda têm. Portanto, ruim com eles, pior sem eles. Mas não vale muito ibope não. Aliás o ibope não vale nada.

Esse post faz questão de singularizar a empresa de Rating do Paulo Rabello de Castro, um cara que venho aprendendo a admirar pela inteligência e coragem de se contrapor ao lugar-comum que prevalece entre os analistas de mercado. Aliás, estou devendo um post sobre esse tipo de criatura. Em geral, são medíocres. O comportamento de manada e, mais importante, as idéias de manada prevalecem. Mas há alguns muito bons. Para debater com eles, é preciso estofo. Voltarei ao tema.

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