É muito interessante a leitura da imprensa chinesa. Os editoriais e os artigos de opinião, especialmente. É claro para eles que há uma disputa de poder entre os países que tem se exacerbado nesse momento de crise e reconfiguração do sistema internacional. Que a China foi humilhada no passado. Que o interesse do Ocidente pode não ser o interesse da China, ou da Ásia. Que o modelo ocidental não é o modelo asiático. Batem pesado às vezes. São diretos.
Hoje, no China Daily, há um artigo de um pensador indiano na página de opinião. O título é "G8 must make way for the new system". Eu teria alguns reparos no detalhe, especialmente ao dizer que o G8 coordena posições antes do G20. Não é tão simples. Os temas não se misturam, a princípio. E mesmo entre o G8 há divergências várias quando o assunto se relaciona à matéria econômico-financeira.
Mas o que gostaria de reiterar é a noção, que deveria ser óbvia, de que o interesse norte-americano, ou europeu, não é necessariamente o interesse chinês, ou da Ásia, ou dos países emergentes. O ponto de vista de um pensador, por exemplo, preocupado com o Brasil, deve ser o Brasil. Nada mais, nada menos. Nossa perspectiva. Nossos interesses. Isso infelizmente não está claro para parte influente de muitos analistas e jornalistas brasileiros, especialmente os funcionários das famílias que controlam os grandes grupos no país. Ao menor sinal de divergência com as velhas potências, eles imediatamente se colocam do lado de lá. Afirmam que o Brasil "tem se metido onde não é chamado"... que "a política externa é megalomaníaca" e "há traços infantis em determinadas atitudes".
Curiosamente, esses mesmos analistas são rápidos ao pedirem que sejamos mais duros com a Bolívia, o Equador, a Argentina, que esqueçamos a África, que não faz sentido ampliarmos nossa representação em países "sem peso". Ou então se esmeram em provar que o BRIC é cheio de divergências. Que o Mercosul não funciona. Que a Unasul é uma piada. "Hillary ignora acordo turco-iraniano-brasileiro e leva pedido de sanções ao Conselho de Segurança". Aí eles têm orgasmos. O Brasil teria se dado mal. Os EUA são o máximo. "Quem mandou se meter onde não é chamado, viu só, a Hillary é quem manda".
São elites decadentes que cresceram mirando os norte-americanos. Hoje a coisa tá confusa. E esse povo perdeu a bússula. Passam ridículo, por vezes. Chega a ser apenas lamentável.
Li que na última edição da Revista Interesse Nacional haveria um artigo do Carlos Eduardo Lins Silva sobre a política externa do próximo governo. Parece-me, sem ter lido o artigo, que ele assinala algo com o qual concordo, e que por absoluta preguiça não havia escrito aqui. Independente de quem ganhar as eleições, as grandes linhas da política externa, nossas posições, nossa atitude perante o mundo, não deve mudar muito. Quase nada. O resto é trolóló, bravata.
Será como o tripé macroeconômico de FHC, mantido por Lula, ampliando as fragilidades criadas por alguns de seus defeitos mas se beneficiando da alta de nossos produtos de exportação. Antes da eleição, muito chôroro. Depois, ao sentar na cadeira, a coisa muda. Plus ça change, plus c'est la même chose.
No caso da política externa, prometo buscar o texto do nosso amigo Carlos Eduardo para aprofundar essa discussão. Estão fazendo falta alguns textos mais opinativos aqui. Muito samba e pouco futebol, como me disse uma amiga espanhola durante o jogo contra Portugal. A ver.
Segue abaixo a introdução do texto do pensador indiano publicado hoje no China Daily. Vejam como vai direto ao ponto. Lição básica de política externa. Da defesa do interesse nacional.
"Over the years, there has been a crescendo of voices from the US and the EU urging that large emerging economies such as India and China be "responsible stakeholders in the international system".
What is left unsaid is that such voices expect Delhi and Beijing to be responsible to Washington and Brussels."
quarta-feira, 7 de julho de 2010
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